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GUARINO GUARINI (III)



De 1675 a 1694, ergue-se a igreja da Imaculada Conceição, em Turim, vindo a sua fachada a ser acabada somente em 1697 ou, segundo outras fontes, somente no início do século seguinte.



Esta igreja também mostra bem a sua génese borrominiana. O seu espaço configura-se através de uma planta invulgar (figura 41.1): dois círculos separados por uma figura geométrica estranha e complexa, cuja "base" seria uma oval. Assim, temos uma primeira câmara de entrada, um "transepto", um presbitério com a Capela-Mor e, presume-se, uma espécie de camarim.
Figura 41.1 . Igreja da Imaculada Conceição . Planta . Turim . 1675/94 . Guarino Guarini

Se a compararmos com a planta de San Carlino (figura 41.2), de Borromini, julgo não ser exagerado dizer-se que Guarini constrangeu os limites interiores e deu mais bojo aos espaços apenas anunciados por Borromini. Inverteu, no entanto, a ordem das áreas, isto é, o sentido transversal perdeu em comprimento e o sentido axial adquiriu dois espaços circulares mais determinados.
Figura 41.2 . San Carlino alle quattro Fontane . Planta . Roma . Francesco Borromini

A vista da Capela-Mor é como se apresenta na figura 41.3. É importante frisar-se que Guarini, tal como seu mestre, mantém as linhas de força dos pilares através da cobertura, numa "sofisticação" gótica. Este espaço interior, que depende quase exclusivamente do sistema construtivo maciço, não deixa, no entanto, de salientar as "possantes" pilastras coríntias, duplas, que também enquadram o Altar-Mor.

Figura 41.3 . Igreja da Imaculada Conceição . Vista do Altar-Mor . Turim . 1675/94 . Guarino Guarini

Estas pilastras, bem como toa a parede perimetral são rematadas por um entablamento requintado que, finalmente, suporta o tecto cuja definição formal se torna algo difícil de definir (figura 41.4): duas cúpulas de ogivas duplas, que se tocam num ponto, também resultante do cruzamento de duas ogivas, dando dois espaços para a inclusão de duas lunetas.

Figura 41.4 . Igreja da Imaculada Conceição . Vista do tecto . Turim . 1675/94 . Guarino Guarini
Cada uma das cúpulas é rasgada por três lunetas. A espacialidade deste templo deve proporcionar momentos de elevação a qualquer crente que o possa desfrutar e, muito profissionalmente, a arquitectos.
A sua fachada principal, de facto, não desmente a influência recebida (figura 41.5).
Figura 41.5 . Igreja da Imaculada Conceição . Alçado principalTurim . 1675/94 . Guarino Guarini

Em Vicenza, é atribuída a Guarini o desenho da igreja de Santa Maria in Aracelli que somente viria a ser consagrada perto de meados do século XVIII. Se a sua planta (figura 41.6) se pode inserir na espacialidade guarinesca, o mesmo não se poderá dizer da concepção da sua fachada.
Figura 41.6 . Igreja Santa Maria in Aracelli . PlantaTurim . Guarino Guarini

A planta apresenta um espaço único, oval, dentro de um outro espaço, paralelo, criando-se uma espécie de três naves que, devido à figura geométrica que o conforma, se traduzem em dois espaços concêntricos. Talvez não seja despropositado penar-se que esta planta, tão simples, afinal, não sendo mais do que a criação de uma "charola" ininterrupta, não tenha estado na base de algumas igrejas barrocas que os Estados Alemães viriam desenvolver.

O tecto deste espaço, que a figura 42.7 mostra, traduz bem as implicações volumétricas que a aparente simplicidade da planta pressupõe.
Figura 41.7 . Igreja Santa Maria in Aracelli . Tecto . Turim . Guarino Guarini

Assim, veja-se que a oval da planta é coberta com uma cúpula em círculo, para o qual os comprimentos dos entablamentos, mais próximos da entrada e do Altar-Mor, são mais curtos. Os outros quatro entablamentos são mais extensos e, além de mais, sofrem um destacamento causado pelo avanço delicado dos pilares/pilastras que geminam as colunas.

A visão natural em direcção ao Altar-Mor, que a figura 41.8 nos mostra, dão bem a subtileza deste arranjo dos suportes verticais, colunas e pilares coríntios.
Figura 41.8 . Igreja Santa Maria in Aracelli . Altar-Mor . Turim . Guarino Guarini

A fachada deste templo (figura 41.9), por não haver notícia, penso que poderá não ser de Guarini. É demasiado "plana" se comparada com as fachadas propostas por ele.
Figura 41.9 . Igreja Santa Maria in Aracelli . Fachada principalTurim . Guarino Guarini

A fachada tem um ligeiro avanço quase se podendo assemelhar a um arco de triunfo aposto sobre a parede do fundo, bastante desprovida de características linguísticas barrocas. O avanço tem colunas e pilastras coríntias e divide-se em dois estratos e dois pisos, por meio de um entablamento com as suas três componentes, sendo o coroamento do segundo estrato/piso feito apenas por uma cornija arquitravada de reduzida altura. Um frontão triangular e interrompido dão o remate a esta composição. É uma fachada quase plana, sem o vigor dos desenhos a que Guarini nos habituou.

Nesta fase final, sobre as obras de Guarini, optei por mostrar os projectos que ele fez e não foram construídos e o seguinte que, tendo sido construído apenas uma fase, acabou por ser derribado (figura 41.10). Trata-se de uma das suas primeiras obras. Foi em Paris - foi a primeira obra barroca em França, a igreja de Sainte Anne-La-Royale, começada em 1662 e abandonada em 1666. Guarini desentendeu-se com o engenheiro e regressou a Itália, nunca mais voltando a Paris. 
Figura 41.10 . Igreja Sainte Anne-La-Royalle. Planta, Corte transversal e fachada principal . Paris . 1662Guarino Guarini
A planta mostra bem a autoria, "centralizando" uma cruz grega a que se soma um presbitério. Criava quatro potentes pilares a que se associavam pilastras e dividia o espaço em entrada, transepto e presbitério alongadíssimo. Na planta encontram-se também marcadas as estruturas do tectos, em abóbadas, como aliás o corte confirma. Pelo corte também se adivinhará o que mais tarde Guarini haveria de construir em São Lourenço.
É sempre de se referir a composição do espaço central. Cobrindo um paralelepípedo quadrado, ergue-se um tambor cilíndrico. Sobe este assenta um outro tamboe, mais pequeno mas que interiormente se revela em cúpula. Sobre esta ergue-se outra cúpula, mais pequena e, sobre esta, finalmente um lanternim.
O volume piramidal poderá ser entendido, talvez, como uma das características que haveria de pontuar a obra de Guarini.
Quanto à fachada principal, mais uma vez San Carlino serviu como inspiração.

Também Guarini, que havia vivido por um par de anos em Messina, dando aulas de matemática e filosofia, provavelmente fez os planos para a Igreja dos Padres Somascos ou seja Chiesa dei Somaschi, a erguer-se em Messina.

A figura 41.11 mostra, à esquerda, um alçado e a planta correspondente ao corte pelo primeiro tambor, e, à direita, um corte transversal.
Figura 41.11 . Chiesa dei Somaschi . Alçado e planta . Corte transversal e planta. MessinaGuarino Guarini
No final da década de 80, e entrando já para a seguinte, Guarino Guarini faz vários projectos para igrejas que não viria a ver construídas e, como tal, somente alguns desenhos seus nos dão conta de como seriam.
San Caetano de Vicenza, ou seja San Gaetano di Vicenza (figura 41.12), na terra de Palladio, Guarini propõe mais uma igreja cuja espacialidade se poderá integrar nas espacialidades a que deu origem. Perante somente este corte, poderá ser uma igreja de cruz grega, como a anterior, aqui as linhas rectas passaram a ser curvas, aumentando o sentido de volúpia que espaços desta natureza provocam.
Figura 41.12 . Chiesa San Gaetano . Alçado e planta .  VicenzaGuarino Guarini
Finalmente, o corte e a planta da Igreja de Santa Maria da Divina Providência (figura 41.13), a construir-se em Lisboa. Depois de termos visto as propostas de plantas de Guarini, esta não nos deveria surpreender. De facto, aqui estão reunificadas as diversas matizes do jogo entre cruz grega e plano alongado, das capelas/naves itercomunicantes, os círculos e as ovais e, numa nota muito curiosa, os pilares escavados oferecendo espaços confessionais. Na verdade, a planta de Sainte Anne-La-Royale já parece conter estes espaços, quer à entrada, quer imediatamente antes da Capela-Mor.
Figura 41.13 . Chiesa Santa Maria della Divina Providenza . Corte longitudinal e planta .  Lisboa 
Guarino Guarini
Para além da delicadeza do desenho, propondo espacialidade(s) singular(es), não pode deixar de ser referida a quase simbiose entre igreja de nave única, obedecendo ao espírito contra-reformista, e a igreja de três naves. Se em Sainte Anne-La-Royalle a tónica seria a fusão entre espacialidade de cruz grega e de cruz latina, sendo mais um "tour-de-force", aqui, na planta proposta para Lisboa a fusão é completa, com o transepto ligeiramente mais largo do que a largura do corpo da igreja. Por sobre o cruzeiro erguer-se-ia um tambor e uma cúpula que, sem mais referência gráfica, porventura sem os arroubos a que Guarini nos habituou.
Mas, o que me parece verdadeiramente espantosa é a coragem do arquitecto teatino ter incorporado pilares cujos fustes são ondeados, mais perecendo um gesto maneirista do que propriamente barroco ou, em última análise, um maneirismo barroco.

A terminar este olhar sobre a obra de Guarini, escolhi duas obras já desapareceram por causa do terramoto do início do século XX que assolou Messina. São as igrejas de São Gregório e da Santíssima Anunciada.

A igreja de São Gregório, de que se reproduz um desenho da fachada (figura 41.14), que expressa melhor a sua configuração do que as fotos ainda existentes, de má definição, é nitidamente um desenho de uma fase da sua actividade em que o émulo aos conceitos de Borromini ainda estava muito presente, veja-se a configuração do terminal da torre.
Figura 41.13 . Igreja de São Gregório . Alçado . Messina . Guarino Guarini
Para além da torre, também o remate da fachada, em frontão curvo e interrompido por outro em chaveta, terá a mesma filologia. O segundo frontão, triangular já será pura invenção guarinesca.

O frontispício da igreja da Santíssima Anunciada (figura 41.14) introduziu o barroco na cidade de Messina. Tratava-se de uma igreja já existente e de uma torre. Ficou muito danificada aquando do terramoto e finalmente destruída num bombardeamento durante a Grande Guerra.
Figura 41.14 . Igreja da Santíssima Anunciada . Alçado . Messina . Guarino Guarini

Guarino Guarini resolve o problema da inserção da torre de uma forma bastante genial. Para isso, desenha uma fachada de planta convexa e côncava, em sentido contrário ao de San Carlino, de Roma, isto é, côncava no centro e convexos os lados. Na espessura da parede do lado da Epístola insere-se a torre de secção octogonal.

Segundo Christian Norberg-Schulz, Guarino Guarini teria afirmado que:
"... o movimento espontâneo de dilatação e contracção não procede de algum princípio; mas é difuso para o inteiro ser vivo."
Talvez que este pensamento de Guarini possa ser mais uma definição da arquitectura a que se convencionou chamar de barroca.

a seguir: (7MAI20)
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na senda de Borromini e Guarini: BERNARDO ANTONIO VITTONE
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GUARINO GUARINI (II)

Sensivelmente da mesma época do Palácio Carignani, 1679, também data o Colégio dos Nobres, de Guarino Guarini, ou seja o Colegio dei Nobili, também em Turim. Com uma planta sem qualquer semelhança com a do Palácio Carignani, o edifício tem uma planta rectangular (figura 40.1) de proporções harmoniosas, acercando-se do duplo quadrado.
Figura 40.1 . Colegio dei Nobili . Planta do piso térreo . Turim . 1679 . Guarino Guarini
No entanto, a contemplação dos alçados parece dar a certeza de que se trata de um desenho de Guarini, atendendo-se a uma escala em que a pormenorização das paredes e dos rasgamentos não deixam dúvidas quanto à autoria.
Figura 40.2 . Colegio dei Nobili . Fachada principal . Turim . 1679 . Guarino Guarini
Os três estratos e três pisos são bem divididos por cornijas arquitravadas, e com as cornijas tornando-se mais elaboradas e mais presentes, à medida que se sobem os andares.Também são dignas de nota as janelas-bandeiras em todos os três pisos,desde as mais simples, no piso térreo, até às mais sofisticadas nos outros dois pisos.
Figura 40.3 . Colegio dei Nobili . Ângulo com a fachada principal . Turim . 1679 . Guarino Guarini
Mais uma vez, estas paredes contentoras são executadas em tijolo, material a que Guarino Guarini deu um relevo de alta significação.
Figura 40.4 . Colegio dei Nobili . Pormenor da fachada principal . Turim . 1679 . Guarino Guarini
A figura 40.4 põe em evidência o trabalho notável de assentamento de tijolo. Se Borromini foi o principal inspirador no que concerne a espacialidade que haveria de se evidenciar a partir do Palácio Carignano - capitulo 39 -, a Miguel Ângelo poderá Guarini ter ido buscar a a-semantização da composição das molduras das janelas, de tão amaneirados que são os recortes das molduras.

E se de influências se poderá falar, além das já mencionadas, algumas mais se poderão notar nas igrejas que se seguem neste olhar para o classicismo arquitectónico.

Em Turim e nas instalações do Palácio Real, Guarini haveria de concretizar dois espaços religiosos da maior importância: A Capela do Santo Sudário - Cappella della Sacra Sindone, e a igreja/capela de São Lourenço. A primeira ter-se-ia começado a construir em 1667 e a segunda um ano depois, acabando-se em 1690.
A Capela do Santo Sudário não é mais do que um espaço pequeno, aposto ao fundo da Capela-Mor do Duomo de Turim, juntando-a ao Palácio Real. É uma construção assaz estranha e para ela se tem de ascender por duas escadas de lanços paralelos, que se desenvolvem por trás do Altar-mor, conforme mostra a figura 40.5.
Figura 40.5 . Cappela della Sacra Sindone . Axonométrica . Turim . 1667 . Guarino Guarini
No seu centro encontra-se um elemento piramidal que contém o pedaço de linho que, segundo os crentes, tem impressa a imagem de Cristo, o Santo Sudário, aquando da sua subida a caminho do Calvário. O pouco espaço disponível é ocupado quase que na totalidade por este monumento que a figura 40.6 ajuda a melhor o visualizar.
Figura 40.6 . Cappela della Sacra Sindone . Turim . 1667 . Guarino Guarini
A planta deste espaço tem um desenho verdadeiramente intrigante, ainda que bem revelador do que proporciona como a figura 40.7 nos elucida. Juntamente com a axonometria atrás mostrada, podemos imaginar este espaço eminentemente vertical terminado por uma cúpula verdadeiramente extraordinária (figura 40.8).
Figura 40.7 . Cappela della Sacra Sindone . Planta . Turim . 1667 . Guarino Guarini
Figura 40.8 . Cappela della Sacra Sindone . Cúpula . Turim . 1667 . Guarino Guarini
Figura 40.8a . Cappela della Sacra Sindone . Cúpula - pormenor do zénite . Turim . 1667 . Guarino Guarini
A figura 40.8a pormenoriza o zénite do interior da cúpula cónica.
A cúpula assenta sobre um tambor não muito alto, sobre o qual assenta uma cúpula que se apoia sobre o referido tambor em apenas três trompas truncadas, cada uma com um óculo redondo. Também outros três óculos se intercalam com estes e sobre o conjunto circular assenta um tambor de seis óculos separados por pequenos tramos rectos. Os óculos e estes tramos rectos constituem uma série de pequenas serlianas e que em cada uma das partes rectas se encaixa uma edícula convexa. Sobre este tambor vai assentar uma outra cúpula que não é mais do que um tronco de cone com pequenas aberturas como nos mostra a figura 40.9, numa composição de extrema audacidade e novidade.
Figura 40.9 . Cappela della Sacra Sindone .interior da Cúpula - pormenor . Turim . 1667 . Guarino Guarini
O exterior deste complexo sistema de remate, já podendo dizer-se que se apresenta como um cone, dá uma certa medida dos jogos de geometrias audazes, fazendo, ainda que sob outros contornos, lembrar a espiral de Sant'Ivo alla Sapienza arquitectada pelo mestre de Guarini,  il Borromini
Figura 40.10 . Cappela della Sacra Sindone . Tambor e cúpula . Turim . 1667 . Guarino Guarini
A figura 40.10 mostra, pelo exterior, as janelas que iluminam o cone. Como se verifica, estas são pequenos rectângulos pareados, enquanto que no interior a forma é de quarto de elipse. Ainda sobre este magnífico exemplar do espírito barroco, na mesma figura pode ver-se, uma vez mais, o trabalho minucioso da alvenaria de tijolo, quer nos medalhões ovais, quer no acentuar do rebordo da cobertura bem como no das janelas. A pontuar as pilastras, as bases e os capitéis são de pedra branca, marcando a diferença.

A poucos metros de distância encontra-se o outro espaço religioso, a igreja de São Lourenço que, segundo o projecto original de Guarini, deveria ter a configuração final que a figura 40.11 revela.
Figura 40.11 . Igreja de São Lourenço . Projecto . Turim . 1668/90 . Guarino Guarini
No entanto, devido a complicações que se perderam e adquiriram vários significados, a "fachada" principal da igreja ficou integrada na fachada das dependências do conjunto palaciano, conforme se vê na figura 40.12.
Figura 40.12 . Igreja de São Lourenço . Alçado "principal" . Turim . 1668/90 . Guarino Guarini
A figura 40.13 mostra o corte transversal e a planta da Igreja de São Lourenço, planta esta que representa o pronau que ficou sem face própria.
Figura 40.13 . Igreja de São Lourenço . Corte transversal e planta . Turim . 1668/90 . Guarino Guarini
A planta deste espaço é também de um requinte imaginativo muito grande: é centralizado pelo uso de oito serlianas convexas perfazendo o seu perímetro. Ao fundo da serliana do meio, em vez dos recessos côncavos, abre-se um espaço mais dilatado, uma oval que, por sua vez, se abre para um espaço curvo, em forma de rim, rematado por duas superfícies também côncavas, onde se encontra a capela-mor. A figura 40.14 dá-nos uma imagem que, embora deformada pela lente, nos faz sentir a completa concentração deste espaço que, baseando-se num cilindro, portanto uma figura receptora, o seu perímetro é constituído, e apenas, por superfícies convexas, opostas, portanto, à concavidade primacial.
Figura 40.14 . Igreja de São Lourenço . Vista interior sobre a Capela-mor . Turim . 1668/90 . Guarino Guarini
A figura 40.15, já sem a deformação da câmara, mostra bem o rigor da concepção, afinal de uma "extrema simplicidade", baseada no vão tripartido da serliana.
Figura 40.15 . Igreja de São Lourenço . Vista interior sobre o lado do Evangelho e sobre a Capela-mor . Turim . 1668/90 . Guarino Guarini
A serliana da direita é a da capela-mor que apenas se distingue, no perímetro interior, pela profundidade maior em relação as outros altares.
As paredes verticais do espaço fruível têm duas formas distintas: quatro desenham arcos, em planta e correspondem à Capela-mor, à entrada e às capelas do Evangelho e da Epístola. As outras quatro paredes compõem-se também de serlianas mas cujas plantas se traduzem em dois tramos curvos, correspondentes aos pórticos, e um tramo recto correspondente ao arco. Os ângulos destes troços rectos com os curvos é bastante obtuso.
A cobertura deste espaço é de uma extrema e estranha concepção: sobre as paredes assenta um entablamento original em que o friso se compõe de duas partes. Sobre este entablamento assentam as perxinas sobre os tramos curvos das serlianas e sobre as serlianas "principais" desenvolvem-se janelas verticais, de planta circular, abertas também em serlianas (figura 40.16)
Figura 40.16 . Igreja de São Lourenço . Vista interior da cúpula . Turim . 1668/90 . Guarino Guarini
A figura 40.17, contudo, é uma maior aproximação do zénite da cúpula.
Figura 40.17 . Igreja de São Lourenço . Vista interior da cúpula . Turim . 1668/90 . Guarino Guarini
Acima desta composição desenvolve-se outra cúpula parabólica que, no exterior, se inscreve num cilindro. A estruturação desta cúpula é de inspiração nitidamente árabe, outro dos aspectos que Guarini vai buscar ao seu mestre Borromini. Compare-se a estrutura desta segunda cúpula com uma das cúpulas da Mesquita Al Hakim (mesquita de Córdova) (figura 40.18 )
Figura 40.18 . Mesquita Al Hakim - Córdova . Vista interior da cúpula
Olhando com alguma atenção e em pormenor, não deixa de ser curioso fazer-se uma abstracção e olhar-se para um pormenor das aberturas insertas na cúpula (figura 40.19), quase que um antropomorfismo claro mostrando olhos, nariz e boca.
igura 40.19 . Igreja de São Lourenço . Vista interior da cúpula - pormenor . Turim . 1668/90
Guarino Guarini
Exteriormente esta cobertura também demonstra uma inventiva de refinada elegância no saber fazer arquitectural de Guarini, conforme se pode ver na figura 40.20. Não, possivelmente, tão original quanto à que vimos anteriormente mas, mesmo assim, temos dois tambores sobrepostos, diminuindo de volume, e sobre o segundo tambor, e mais pequeno, uma cúpula com oito óculos e sobre a cúpula ainda um remate simulando um lanternim cego.
Figura 40.20 . Igreja de São Lourenço . Coroamento . Turim . 1668/90
Guarino Guarini
Esta cobertura tem ainda alguns aspectos que não posso deixar de os acentuar: No primeiro tambor, abrem-se oito janelas em forma oval, adornadas de delicadas molduras ondulantes. As paredes deste tambor são ligeiramente côncavas e separam-se umas das outras por pilastras simplificadas e por uma cornija arquitravada que se rompe no meio com um pequeno janelo rectangular sobreposto por um pequeno frontão curvo. Entre este tambor e o tambor superior abrem-se janelas em pequenos avanços convexos que se intercalam com pequeníssimos janelos. Sobre estes, o segundo tambor faz-se com oito paredes convexas, com janelas ladeadas por colunas, e que se separam por pilastras. Finalmente a cúpula que é dividida por oito nervuras provocando oito calotes onde se inserem pequenas janelas ovais, também estas orladas por molduras ondulantes.

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