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4JUL19
As VILLE Paladianas - as "duas jóias" da coroa


Figura 20.1 . Villa Barbaro . 1560 (in.) . Vista do conjunto com a Igreja/capela Barbaro . Maser. Andrea Palladio
Embora a Villa Barbaro (figura 20.1) seja anterior às vilas Badoer e Emo, por razões difíceis de explicar a não ser em termos pessoalíssimos e de difícil tradução, portanto, não traduzíveis consensualmente, penso que a Villa Barbaro e a Villa Capra (Rotonda) são os dois pontos culminantes na arquitectura das casas de campo de Palladio. Mesmo sem poder esquecer, lembrando até, a simplicidade maneirista da Villa Poiana. Se a Villa Rotonda é a vila nec plus ultra, curiosamente, a Barbaro abre uma porta dificílima de se fechar ao prenunciar o período barroco, enquanto que a Rotonda fecha a centralidade renascentista.

Se este pensamento ultrapassar a esfera meramente pessoal, penso que também aqui se está em presença da versatilidade extraordinária e de um virtuosismo quase impossível de ser igualado, tal a genialidade de Andrea Palladio. 



No universo das vilas Palladianas, a Villa Barbaro é, talvez de todas, a mais emblemática no sentido em que parece pertencer a um outro universo, a uma nova forma de elaboração discursiva da mestria de Palladio.
Figura 20.2. Villa Barbaro . 1560 . Planta do piso térreo e alçado principal . Maser . Andrea Palladio
Analisemos esta vila e comecemos pela localização das barchesse que, nos extremos, quase se constituem como "templos" autónomos, com dois estratos, de 3 arcos no primeiro e de uma oval cega no segundo, rematados que são por 3 acrotérios e respectivas estátuas sobre eles. Estes elementos escultóricos ficaram, no entanto, apenas no projecto.
O corpo principal da casa, na sua volumetria “cúbica”, volumétrica, quase perfeita, também se dissocia das barchesse, através de duas escadas simétricas, apostas à extremidade do braço da cruz, que perfaz o imo da casa, propriamente dita. Este salão cruciforme (figura 20.3) tem associadas uma sala em cada esquina da cruz. E, em planta, a cruz “quase grega” (os lados longitudinais e iguais são mais extensos do que os transversais, também iguais entre si) estabelece os limites do quadrilátero que perfaz o perímetro da casa. É uma solução extremamente engenhosa de se centralizar um espaço: uma ideia de casa.

              Figura 20.3 . Villa Barbaro . 1560 . Salão principal, em “cruz grega” . Maser . Andrea Palladio

A fachada principal é composta por três elementos fundamentais, ligados pela duas barchesse constituídas por arcadas (figuras 20.4 e 20A.4). O corpo principal adquire, intrinsecamente, a consubstancia de um tetrastilo, na medida em que não se apõe como um pórtico, mas contém, nos seus intercolúnios o próprio corpo da casa. As quatro colunas marcam o ritmo da fachada em três tramos a a’ a, pois que os intercolúnios são iguais, diferindo apenas a sua materialização. Assim, os tramos a compõem-se de uma janela no rés-do-chão e outra alinhada verticalmente no primeiro andar. As do primeiro piso têm o frontão arredondado e separado da moldura da janela que, embora de uma forma bastante ténue, reproduz uma “janela ajoelhada”. As janelas superiores, de cada lado, são rematadas por frontões triangulares unidos às molduras, sem hiatos como as de baixo.

Figura 20.4 . Villa Barbaro . 1560 . Fachada principal . Maser . Andrea Palladio


Figura 20A.4 . Villa Barbaro . 1560 . Fachada principal . Maser . Andrea Palladio
E a figura 20.5 refere-se ao "templo" central, em tetrastilo e de entablamento interrompido.
Figura 20.5 . Villa Barbaro . 1560 . Fachada principal (pormenor) . Maser . Andrea Palladio

A parte central deste alçado irrompe pelo tímpano de um modo que, a não haver mais notícia, se poderia dizer como mais do que protobarroco (figura 20.5). Na verdade, o arco que constitui a padieira da janela central, que prolonga a porta de acesso e estando praticamente a ela ligada, ocupa todo o espaço destinado ao entablamento, majestoso, que coroa este tetrastilo. Como se não fora suficiente, o arco é encimado por um par de guirlandas seguras por pombas, guirlandas essas que se apoiam em motivos heráldicos. A ordem jónica é de uma perfeição extremadamente simples, e o entablamento também se acerta com esta monumentalidade. Resta apenas acrescentar a profusão de estatuária presente no tímpano. As cornijas são mutuladas.


Figura 20.6 . Barchessa da Villa Barbaro. Andrea Palladio

O alçado das zonas de ligação das barchesse aos extremos são do mesmo tipo que as da Villa Emo haveria de repetir, isto é, são arcadas assentes em pilares de capiteis e bases em faixas, simples e sem adornos.
Penso que não será de mais assinalar os extremos compositivos a que Palladio recorre: a singeleza das ligações às barchesse e a redundância do tímpano do frontão que encima a entrada da casa.


Figura 20.7 . Villa Barbaro . 1560 . Frente dos topod das barchesse . Maser . Andrea Palladio



As fachadas dos extremos das barchesse instituem-se quase como a frente de uma igreja de três naves a que foi necessário ligar as diferentes alturas através do subterfúgio de um esquadro curvo, tal como vimos acontecer em Santa Maria Novella, pelo desenho de Leon Alberti como se pode ver na figura 20.7.
A imafronte é resolvida em três arcos separados por pilastras refundadas nos seus centros como nichos rectangulares abrigando estátuas. A cimafronte ostenta um enorme relógio de sol. Não podemos esquecer de que as horas, marcando o tempo das tarefas para a lavoura e demais trabalhos campestres, eram primordiais.
Há ainda que fazer referência ao ninfeu (figura 20.8) que se criou junto a uma fonte de água natural, em pleno jardim.
Figura 20.8 . Ninfeu . Villa Barbaro

A Villa Barbaro foi encomendada pelos dois irmãos Barbaro: Marcantonio, que era procurador em Veneza, e Daniele que era clérigo. Pensa-se que as quatro figuras mais relevantes desta panóplia de estátuas, as extremas e as do meio se devem à veia escultórica de Marcantonio. Além destas esculturas, o interior da Villa Barbaro tem requintes de arte pictórica, como os frescos desta enfilade (figura 20.9) que se deve a Paolo Veronese.

Figura 20.9 . Enfilade . Villa Barbaro. Paolo Veronese


Como requinte máximo de uma vila campestre, como eram as que se apresentaram, temos a Villa Capra ou Villa Capra detta la Rotonda ou Villa Americo-Capra ou Villa Capra-Valmarana ou ainda e, talvez a melhor designação: a Villa Rotonda (figura 20.10).



Figura 20.10 . Villa Rotonda . 1550/59 . Alçado, planta e corte . Vicenza . Andrea Pallado

De uma perfeição absoluta, esta vila irá marcar durante séculos o aspecto nec plus ultra de uma residência senhorial. Nos arredores imediatos de Vicenza, à altura em que se edificou, parece ser a conclusão máxima de uma planta centralizada para a habitação que Palladio tinha ensaiado até chegar ao limite da perfeição. A vila, sem mais algum elemento que a prolongue como com as barchesse que vimos noutros exemplos, implanta-se num lugar altaneiro, mas absolutamente afastado do centro geométrico do terreno, aliás quase que num extremo, devido, também, à morfologia deste (figura 16.11).
Figura 20.11 . Villa Rotonda . 1550/59 . Implantação . Andrea Paladio



De facto, a vila, de quatro alçados iguais, sem alçado principal, 

"deveria" estar no meio de uma propriedade sem lados favoritos e, em última instância, ter quatro acessos equidistantes das quatro entradas iguais..."
Situa-se quase num dos limites da propriedade, e o acesso principal é feito a uma cota bastante inferior ao piso térreo, conforme o confirmam as figuras 20.11 e 21.12.
Figura 20.12 . Villa Rotonda . 1550/59 . Vista da Entrada na propriedade . Vicenza . Andrea Palladio

Figura 20.13 . Villa Rotonda . Alçado(s) principal(is). Andrea Palladio


Figura 20.14 . Villa Rotonda . 1550/57 . Fachada(s) principal(is). Vicenza . Andrea PAlldio

O alçado divide-se em três tramos, a b a , constituindo-se o do meio como um pronao, um pórtico hexastilo da ordem jónica, numa linguagem desprovida de mais adjectivações. Remata o pórtico um frontão de arquitrave formada de três faixas a que se sobrepõe um friso apenas ligeiramente bombeado e uma cornija que parece ser denticulada, tal a dimensão dos “dentes” ou “mútulas”.
Coroam os quatro frontões três estátuas, sobre os respectivos acrotérios, um central e os outros lateralmente no início das rampantes. O(s) alçado(s) principal (is) são de um rigor notável no que respeita não só à articulação sintagmática da linguagem do edifício como também ao rigor paradigmático que veio a criar.

La Rotonda ou, a Rotunda, em português, parece ser o nome mais indicado para esta casa magnífica. De facto, quem tiver paciência para se inteirar das vilas que Pallladio construiu detectará que a ideia de uma centralidade esteve sempre presente. Das oito vilas atrás mostradas, se poderá constatar que das sete plantas apresentadas, todas parecem convergir para esta centralidade em que uma cruz grega se implanta como o cuore da casa, particulatmente a Vila Emo. Cuore esse que "profana" o significante cúpula, trazendo-o para a esfera doméstica, familiar, ombreando com o significado "céu" que esse significante normalmente implicava na Casa de Deus.
Figura 20.15 . Cúpula da Villa Rotonda

Também no interior desta peça de arquitectura notável, há outros pormenores, como por exemplo o da figura 16.16 nos mostra, com efabulações rompendo frontões. 

São absolutamente adjectiváveis de barrocos, quase quatro décadas antes de ele acontecer...


Figura 20.16 . Pormenor da padieira de uma porta interior . Villa Rotonda . Andrea Palladio


Palladio previa uma cúpula que teria uma configuração normal, possivelmente uma semi-esfera ou pelo menos um bojo mais pronunciado do que o que a cúpula de Vicenzo Scamozzi veio a coroar o centro da Rotonda.
Figura 20.17 . Villa Rotonda . A cúpula se tivera sido a de Andrea Palladio
Quanto mais se tenta descrever esta casa, tanto mais as palavras parecem faltar, tal a sua grande lógica formal e significativa.
a seguir: (18JUL19)

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I PALAZZI de Palladio

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