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7MAI20 
Na senda de Borromini e de Guarini - BERNARDO VITTONE 

Bernardo Antonio Vittone, natural de Turim, onde nasceu e morreu - 1704/70, portanto já do século XVIII, foi um seguidor de Guarini e, por via desta influência, também Borromini terá estado nos seus "genes" arquitectónicos.
E, começando na influência deste último, outra coisa não se poderia dizer do projecto que a figura 42.1 nos apresenta. Com efeito, a planta, relativa ao acesso principal do templo, constitui uma clara referência ao acesso da igreja de Sant'Agnese in Agone, de Roma (figura 42.2).
Figura 42.1 . Planta de igreja . Bernardo Vittone
Figura 42.2 . Perspectva sobre a fachada de Sant'Agnese in Agone . Roma
A fachada do templo, aqui vista em desenho perspectivado, no que teria sido a resultante do projecto de Borroomini e não a que viria a ser construída. A fachada actual, com algumas dissemelhanças em relação à de Borromini, foi projectada por Rainaldi, e é muito mais próxima da proposta para o templo desenhado por Vittone (figura 42.3), não só no número de estratos das torres, bem como nos respectivos remates, bem como nas aduelas duplas da cúpula que encima a nave.
Figura 42.3 . Alçado de igreja . Bernardo Vittone
Na incerteza de referências fidedignas sobre os desenhos aqui apresentados, planta e alçado da igreja de Guarini, não sei se não será de levantar a dúvida se seria, de facto, um projecto ou se não seria uma interpretação e aprimoração do projecto de Sant'Agnese in Agone.

De 1730 data a igreja de Santa Maria Madalena, de Alba, cuja fachada nunca foi completada (figura 42.4), tendo-se mantido, até hoje, em tijolo. Apesar do aspecto de inacabada, a geometria visível deixa bem clara a influência recebida. 
Figura 42.4 Igreja de Santa Madalena . Fachada . Alba . 1730
Bernardo Vittone
Não deixa de apresentar um forte contraste com a composição notável do retábulo da sua capela-mor (figura 42.5), mostrando, também, a sua autoria.
Figura 42.5 Igreja de Santa Madalena . Altar-Mor . Alba . 1730
Bernardo Vittone
Entre 1738 e 1739, ergue-se o Santuário da Visitação ou Vallinotto, em Carignano, região turinesa.
É uma igreja de planta centralizada (figura 42.6) no tardoz de cuja Capela-Mor se desenvolve um corpo paralelepipédico, contendo a sacristia e outras dependências. A planta relativa ao corpo da igreja resulta de um exercício de desenho que tem por base um hexágono e uma cruz de seis pontas, a chamada estrela de David, conotada com o judaísmo. Tal como acontecia com a planta borrominiana de Sant'Ivo alla Sapienza.
Figura 42.6 Igreja de Vallinotto . Carignano .Corte e planta . Alba
1738/9 . 
Bernardo Vittone
A figura 42.6 representa apenas o corpo da igreja, sendo a entrada no lado direito e a Capela-Mor no lado esquerdo ao qual está adossado o referido corpo paralelepipédico como se pode observar na figura 42.7.
Figura 42.7 Igreja de Vallinotto . Carignano . Fachada do lado do Evangelho . Alba . 1738/9 . Bernardo Vittone
Curiosamente, o corpo correspondente ao primeiro estrato e, interiormente, à nave, propriamente dita, lembra o tambor de Santo Ivo, de Borromini, enquanto que os dois tambores trazem à lembrança São Lourenço de Guarini.
Figura 42.8 Igreja de Vallinotto . Carignano . Vista interior da entrada no templo Alba
1738/9 . Bernardo Vittone
O interior é mais um "delírio" a que o barroco deu corpo, como se poderá ver na figura 42.8, mostrando o interior da zona da entrada. Como seria de se esperar, as paredes que contém este espaço dão a sustentação para uma cobertura fascinante, tal o imbricado das geometrias (figura 42.9).
Figura 42.9 Igreja de Vallinotto . Carignano . Vista interior sobre o Altar-Mor . Alba
1738/9 . Bernardo Vittone
E, numa solução assaz caprichosa, a luz irrompe através dos três tambores. De referir que o primeiro tambor tem "paredes" duplas. Isto significa que os pilares sustentam uma arcaria que se desenvolve afastada do perímetro interior do tambor, fazendo com que a luz vinda dos óculos desse tambor se insinue por cima da referida arcaria, como se vê na figura 42.9. Sobre esta arcaria desenvolve-se, então, uma abóbada/cúpula hexagonal, também como Guarini, indo buscar a inspiração à arquitectura árabe (figura 42.10).
Figura 42.10 Igreja de Vallinotto . Carignano . Vista interior da cúpula . Alba . 1738/9 . Bernardo Vittone
Santa Clara de Bra é outra das igrejas concebidas por Vittone, também no aro de Turim. O volume da igreja, propriamente dita, também se ergue verticalmente (figura 42.11), acoplada a um outro corpo paralelepipédico, um tanto como a da Visitação, acima mostrada.
Figura 42.11.  Igreja de Santa Clara de Bra . 1742 . Bernardo Vittone
Enquanto que na anterior Vittone exaltava as potencialidades das geometrias complexas de um hexágono, aqui, na igreja de Santa Clara, de Bra, é sobre o quadrado que ele vai exercer a sua genialidade compositiva (figura 42.12).
Figura 42.12 Igreja de Santa Clara de Bra . Corte e planta da igreja . 1742 . Bernardo Vittone
O corpo, resultante da intersecção de quatro meios cilindros, prolonga-se por dois estratos, sendo o superior quase que entendido como um tambor sobre o qual assenta a cúpula em meia esfera. Também com o recurso a paredes interiores, desligadas das exteriores, com óculos nelas inseridos, provoca a sensação idêntica à igreja da Visitação, isto é, provocando tridimensionalidades acrescidas, conforme a figura 42.13 tão bem demonstra.
Figura 42.13 Igreja de Santa Clara de Bra . Perspectiva sobre o Altar-Mor e cúpula
1742 . Bernardo Vittone
Também Vittone parece ter herdado o gosto pela acentuação das estruturas que suportam a cúpula. Assim, o tambor eleva-se e é sustentado por quatro pares de colunas que suportam as aduelas da cúpula. Também esta disposição de colunas alternando com arcos perfazem quatro serlianas, ainda que de uma forma indirecta, mas cujo centro se realça pelo dispositivo dos óculos superiores. Por fim o lanternim, pontuando o zénite espiritual. 
Figura 42.14 Igreja de Santa Clara de Bra . Pormenor da cúpula do Altar-Mor
1742 . Bernardo Vittone
A figura 42.14 mostra o detalhe da cobertura do retábulo do altar-mor constituída por uma cúpula abatida de perfil oval, e o varandim que percorre o perímetro relativo ao primeiro estrato do interior do templo.
Parece-me ainda de realçar o contraste grande entre interior e exterior. Este, de recorte também algo "atormentado" (figura 42.15), é, apesar de tudo, bastante contido em relação ao espaço que encerra.
Figura 42.15 Igreja de Santa Clara de Bra .Fachada principal e do lado da Epístola
1742 . Bernardo Vittone
O uso do tijolo como superfície também ajuda um tanto ao jogo de contenção da volumetria, em geral. No entanto, repare-se no jogo "aplanador" das pilastras duplas bem como no entablamento  e ático onde assenta o segundo estrato. Finalmente, o coroamento deste segundo estrato prepara-se a apoteose branca do conjunto da cobertura.

A figura 42.16 mostra o tecto da igreja de Santa Clara de Turim, que esteve vários anos encerrada e foi finalmente recuperada e aberta ao público há pouco tempo.
Figura 42.15 Igreja de Santa Clara de Turim . Tecto . 1742/45 . Bernardo Vittone
Não deixa de ser interessante que, por mais diversas que sejam as soluções compositivas, Vittone, tal como Borromini e Guarini, pronuncia sempre as "possíveis" estruturações. Aqui, sublinhando mais uma vez quatro serlianas cujos arcos respaldam meias cúpulas esféricas e os tramos rectos são continuados, para cima, acabando em oito arcos, de ritmo a a' a a' a a' a a' sobrepondo o ritmo a b a b a b a b já referido. Finalmente, uma cúpula com duplas aduelas que se rematam num círculo perfeito, fonte de luz zenital que o lanternim permite.

Em 1753 inicia-se a construção da igreja de Santa Maria Assunta, em Grignasco, levando 30 anos a concluir-se, já depois da morte de Vittone (1770).
É um templo de planta centralizada e submetida à Proporção Harmónica. A sua planta recorre mais uma vez a um hexágono. No entanto, a Capela-Mor introduz um motivo de percepção de descentralização, dada a sua profundidade que a figura 42.16 demonstra.
Figura 42.16 Igreja de Santa Maria Assunta .  Carignano . Planta do tecto e do espaço
1753/83 . 
Bernardo Vittone
O seu tecto revela, também e mais uma vez, a mestria de Vittone (figura 42.17). O órgão assinala a zona da entrada (lado direito da foto).
Figura 42.17 Igreja de Santa Maria Assunta .  Carignano . Tecto . 1753/83
 Bernardo Vittone
Também tal como as que vimos, o espaço é contornado  por dupla parede e os rasgamentos são de extrema sofisticação (figura 42.18), bem como o seu exterior que revela a contenção que esconde o "devaneio" barroco do interior (figura 42.19).
Figura 42.18 Igreja de Santa Maria Assunta .  Carignano
Zona da entrada para o espaço . 1753/83 . Bernardo Vittone
Figura 42.19 . Igreja de Santa Maria Assunta . Carignano . Fachada principal . Bernardo Vittone


E, mais uma vez, o tijolo como parede estrutural e como acabamento, e a parte superior, conotada com a zona celestial, rebocada e pintada de branco.

a seguir: (21MAI20)
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BALDASSARE LONGHENA

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