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21MAI20
Origem da "FACHADA BARROCA"
GIACOMO DELLA PORTA
Depois de havermos visto as obras de dois turinenses, barrocos brilhantes, voltemos novamente a Roma e vejamos o "alçado-seminal" que haveria de se multiplicar sob as mais variadas formulações, tanto em Itália como pelo resto da Europa: a fachada da igreja de Jesus, a Chiesa del Gesù, em Roma. O corpo da igreja, que obedece quase que na íntegra aos ditames do Concílio de Trento, deve-se a Giacomo Barozzi da Vignola. No entanto, a fachada (1571/84) deve-se ao desenho (figura 43.1) de Giacomo della Porta.
Figura 43.1 . Il Gesù . Fachada . Giacomo della Porta . 1571/84 |
A composição deste elemento consagra dois estratos/pisos, de cinco tramos no primeiro piso e de três tramos no segundo. Os tramos extremos do primeiro piso transmutam-se em volutas no estrato superior, tridimensionando as volutas planas que Alberti criou para a fachada de Santa Maria Novella, em Florença. Estas volutas foram repetidas "infinitas" vezes. Da necessidade de fazer a transição entre as naves laterais para a nave central de Santa Maria Novella, Florença, passou também a ser a transição das capelas cripto-colaterais para a nave única tridentina.
Da ordem coríntia é a estruturação do primeiro estrato e da ordem compósita o segundo. Os tramos são divididos por pilastras duplas, exceptuando o central, do primeiro piso, em que a entrada tem uma estrutura baseada em duas colunas. Todos os elementos verticais estruturantes têm pedestal, assim como os do segundo estrato, em que os pedestais salientam do ático base. Curiosa é a fusão dos pedestais destas quatro pilastras centrais que, por sua vez, servem de estilóbato às duas colunas que emolduram a janela central.
Se é certo que a fachada de Santa Susana (figura 43.2), da autoria de Carlo Maderno, poderá ter sido já influenciada por Il Gèsú, no entanto, e como já havíamos visto, ela contém em si a movimentação da convexidade. Convexidade essa que juntamente com a contraditória concavidade haveria de enformar inúmeras fachadas barrocas.
Figura 43.2 . Igreja de Santa Susana . Fachada . Roma . Carlo Maderno . 1603 |
Mas, neste caso de Santa Susana, o efeito de curvatura in nuce, reduziu o efeito dos cinco tramos de Il Gesú, de a a' b a' a para a b c b a.
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BALDASSARE LONGHENA
Baldassare Longhena foi um dos expoentes do barroco, não com obra em Roma, berço do barroco, mas no aro de Veneza. Cidade onde nasceu em 1598 e morreu em 1682, com a provecta idade de 84 anos.
E ao contemplar-se a fachada de Santa Maria da Nazaré (figura 43.3), em Veneza, pode verificar-se o "salto" que o despojamento de Il Gesù sofreu, passados cem anos. Esta igreja também é conhecida por Santa Maria dos Descalços, na medida em que é a igreja sede dos Carmelitas Descalços.
Figura 43.3 . Igreja de Santa Maria dos Descalços . Fachada . Veneza . Baldassare Longhena . 1672/1705 |
É como se à frente da fachada de Il Gésù se tivesse gerado uma outra fachada, repetindo os elementos tectónicos, colunas geminadas salientando-se das pilastras geminadas, e as respectivas bases também duplicadas em avanço. As volutas "originais" retraem-se um tanto, transformando-se em meros motivos vegetais e dando lugar a estatuária no topo das colunas geminadas extremas. O frontão, duplo, inverte a ordem do frontão da entrada da igreja romana, inscrevendo-se, aqui, o redondo dentro do triangular. Tanto as cornijas dos frontões quanto dos dois entablamentos são denticuladas.
A exuberância desta fachada só teria uma réplica ainda mais exagerada na fachada da igreja dell'Ospedaletto (figuras 43.4 e 43.5), também em Veneza. Foi uma fachada aposta à pré-existente igreja que havia sido projectada por Palladio.
Figura 43.4 . Chiesa dell'Ospedaletto . Fachada (pormenor) Veneza . Baldassare Longhena |
Figura 43.5 . Chiesa dell'Ospedaletto . Fachada (pormenor) Veneza . Baldassare Longhena |
A Villa Angarano, em Bassano della Grappa, na Província de Vicenza, foi um projecto de Andrea Palladio, datado de 1554/56 (figura 43.6). Somente foram construídas, e em parte, as barchese. O núcleo central, a vila propriamente dita, é obra de Longhena.
Figura 43.6 . Villa Angarano . Bassano della Grappa . Andrea Palladio e Baldassare Longhena |
É interessante o que a figura 43.7 nos revela: as barchese palladianas e a composição formal barroca de Longhena. É curiosa a maneira como Longhena interfere/interpreta o alçado principal da casa: aos dois pisos primeiramente propostos acrescenta-lhes um mezanino e um terceiro piso.
Figura 43.7 . Villa Angarano . Bassano della Grappa . Andrea Palladio e Baldassare Longhena |
Ao manter a divisão tripartida do alçado, enriquece o tramo central subdividindo-o em três, numa composição a a' a, a que a porta de admissão e a interrupção do frontão dão o mote compositivo.
Figura 43.8 . Villa Angarano . Bassano della Grappa . Baldassare Longhena |
A separação dos estratos/pisos é bastante subtil, havendo somente um pequeno relevo da cornija suportando as janelas áticas. É bastante elucidativo o cuidado de Longhena em compatibilizar o corpo da moradia com a colunata dórica palladiana, empolando somente de um modo vigorosamente barroco a parte centra da casa.
No Grande Canal, de Veneza, Baldassare Longhena tem dois palácios da sua autoria. São eles o Giustiniani Lolin (figura 43.9), obra de juventude, e o Belloni Battagia (figura 43.10).
Figura 43.9 . Palácio Giustiniani Lolin . Veneza . Baldassare Longhena |
Com três estratos/pisos e um ático/piso, quatro pisos, no total, este palácio é dos poucos que ostentam acrotérios em forma de obeliscos, no Grande Canal. É interessante notar que este tipo de acrotério em forma de obelisco tinha sido usado por Sansovino, na Biblioteca Marciana. O terem sido acrescentados posteriormente é uma hipótese que se pode levantar, dado ser um remate tão pouco usual no século XVI.
Esta fachada é muito interessante pela forma como apresenta os seus rasgamentos: 1+5+1. Os três do meio formam uma espécie de serliana em que por cima dos respectivos tramos rectos se abrem janelas quadradas.
Em contraste com a "tranquilidade" desta fachada, a do palácio Belloni Battagia (figura 43.10) é mesmo já tipicamente barroca na sua veemência.
Figura 43.10 . Palácio Belloni Battagia . Veneza . Baldassare Longhena |
De facto, é preciso um grande arquitecto para ser capaz de projectar duas fachadas similares, no número de pisos habitáveis e no número de rasgamentos, e dividir a fachada em dois estratos e não em três, como no anterior. Mantém o ático, o mesmo remate denticulado da cornija superior e dois acrotérios/obeliscos. A entrada torna-se mais imponente, rematada por um frontão triangular. As janelas do piano nobile são de padieira em arco e rematadas por frontões curvos, interrompidos, sendo o do meio ligeiramente mais largo. e, como uma nota curiosa, a janela ática do meio não existe.
Na ponta oeste do bairro de Dorsoduro (figura 43.11), de Veneza, ergue-se a obra-prima de Baldassare Longhena: a Basílica de Santa Maria della Salute, obra de agradecimento da populaçãoveneziana pela extinção da epidemia de cólera que tinha assolado a sua cidade.
Figura 43.11 . Extremo de Dosrsoduro e a igreja de Santa Maria da Saúde . Veneza . Baldassare Longhena |
É uma obra grandiosa, um dos pontos-chave da imagem veneziana. De fronte ao convento de São Jorge Maior, a cobertura do seu altar-mor, ladeado por duas torres, dá a devida réplica à igreja recuperada por Palladio.
Curiosamente, a planta desta igreja (figura 43.12) remete-nos muito mais para os inícios renascentistas do que propriamente para os espaços barrocos, haja em vista a centralidade da sua nave, inscrita num octógono, e a "tranquilidade" decorativa do seu interior (figura 43.13).
Figura 43.12 . Igreja de Santa Maria da Saúde . Planta . Veneza . 1631/1681 Baldassare Longhena |
Figura 43.13 . Igreja de Santa Maria da Saúde . Interior . Veneza . 1631/1381 . Baldassare Longhena |
É curioso o contraste absoluto com o seu exterior (figura 43.14). É certo que os lados do octógono são demarcados por pilastras duplas a que se adossam colunas quase isentas, servindo também como suportes para estátuas, quase que dando réplica a estilitas. Uma composição mais típica do seiscentos do que de períodos posteriores.
A cúpula deste templo, com um perfil muito parecido com a de São Jorge Maior, tem como remate um lanternim de calote hemisférica que se apoia em oito pilares que, por sua vez, se apoiam na cúpula maior através de enrolamentos que se detêm em pequenos obeliscos.
Figura 43.14 . Igreja de Santa Maria da Saúde . Exterior . Veneza . 1631/1381 . Baldassare Longhena |
O exterior deste edifício é de uma engenhosidade notável, bastante original no que concerne a que seis lados do octógono corresponderem a uma espécie de frontaria a que somente falta a porta de acesso. E esta, diametralmente oposta à Capela-Mor, mais uma vez se reveste de uma exuberância "baldassariana".
Notáveis são os enrolamentos que descarregam as cargas dos tambores e da cúpula, dois por cada lado do octógono, como a figura 43.15 nos mostra. Baldassare, nesta sua obra, faz a apologia dos elementos construtivos, tal como penso que é um dos apanágios do período barroco: a apoteose dos elementos tectónicos, herança da arquitectura que nasceu na Grécia.
Figura 43.15 . Igreja de Santa Maria da Saúde . Pormenor do exterior . Veneza . 1631/1381 . Baldassare Longhena |
Como última imagem, um pormenor da fachada principal desta igreja (figura 43.16), em que se podem verificar as parecenças com a já anteriormente mostrada, a de Santa Maria dos Descalços.
Figura 43.16 . Igreja de Santa Maria da Saúde . Pormenor da entrada . Veneza 1631/1381 . Baldassare Longhena |
a seguir: (30JUL20)
FRANÇA . INGLATERRA . ALEMANHA . ESPANHA
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