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19DEZ19 
Pietro da Cortona - II Parte

De 1658 a 1662, é encomendada a Pietro da Cortona a fachada de Santa Maria in Via Lata. Numa rua sem grande amplitude para poder utilizar formas protuberantes, escolhe fazer uma fachada plana, com a parte central ligeiramente salientando-se às partes laterais. Faz uma fachada tridimensional, constituindo-se como um bloco quase autónomo, com um espaço entre a "fachada exterior" e a "fachada interior". Pelo exterior (figura 32.1) podemos dizer que há uma certa duplicação de tramos: a b a, na forma genérica em que os a são estreitos e contidos entre pilastras e o b contém cinco tramos, num crescendo até ao central. Assim, poderíamos dizer que o tramo b se divide em b' b'' b''' b'' b', tanto no primeiro como no segundo estrato.
Estes dois estratos são separados por um entablamento de cornija bastante saliente e sobre a qual assenta um ático dado sobre o qual assenta o segundo estrato que, tal como o primeiro, se divide no mesmo número e qualidade de tramos.
Figura 32.1 . Igreja de Santa Maria in Via Lata . Fachada principal . Roma . 1658/1662
Pietro da Cortona
O remate superior desta fachada é deveras curioso (figura 32.2). O entablamento que se sobrepõe parece fazer uma simbiose, não se distinguido claramente os seus três habituais componentes. Para além disso, entre as duas colunas do meio que perfazem o tramo b''', o entablamento transforma-se em arco, resultando como uma serliana a que se tivessem acrescentado mais dois tramos rectos de cada lado do arco.
Figura 32.2 . Igreja de Santa Maria in Via Lata . Fachada principal - pormenor . Roma . 1658/1662
Pietro da Cortona
Esta "serliana", composta, é encimada por um frontão triangular com as rampantes com modinaturas paralelas. Mais uma vez da Cortona utiliza colunas e pilastras numa sucessão de justaposições e sobreposições.
Figura 32.3 . Igreja de Santa Maria in Via Lata . Fachada principal - pormenor doentablamento superior
Roma . 1658/1662 . Pietro da Cortona
A figura 32.3 mostra bem o detalhe construtivo e alusivo do manuseamento das ordens clássicas pela mão de Pietro da Cortona: os capitéis compósitos quase não se distinguindo da ordem coríntia, quer pelo desenvolvimento das volutas, quer pela ténue separação entre folhagem e astragalo com óvulos, quer ainda pela delicadeza com que desenha os ábacos; ainda as nervuras com que marca a arquitrave, as nervuras ainda mais diáfanas com que decora o friso e, finalmente, a delicadeza da cornija, ainda que esta seja algo projectante.

A fachada é, de facto, um desenho não convencional ou não expectado, dada a sua originalidade como também demonstra Pietro da Cortona grande originalidade no pronau (parte amarelada da figura 32.4) que desenhou. É uma "câmara" estreita e comprida, um rectângulo com os lados pequenos em meio-círculo ou, se preferirmos tridimensionalizar este espaço, poderemos descrevê-lo como um paralelepípedo cujos lados menores são meios cilindros, como bem mostra a figura 32.5. O tecto compõe-se de uma abóbada de berço rematada por meias cúpulas esféricas.
Figura 32.4. Igreja de Santa Maria in Via Lata . "pronau" - pormenor da parte superior . Roma . 1658/1662
Pietro da Cortona
A superfície da abóbada é revestida com octógonos salientes que alternam com quadrados e as semi-cúpulas são revestidas por aduelas longitudinais e transversais.
Figura 32.5. Igreja de Santa Maria in Via Lata . "pronau" - pormenor dos cantos
Roma . 1658/1662 . Pietro da Cortona
Nesta imagem 32.5 pode notar-se a composição a duas escalas que da Cortona imprime a este vestíbulo. As colunas coríntias são bastante "efusivas" na sua folhagem, fazendo a justa contraposição ao entablamento que envolve o meio-cilindro onde a porta e a janela nos reportam à escala humana.

Uma das última obras de arquitectura de da Cortona foi a cúpula de San Carlo al Corso, em Roma. O tambor é constituído pela acumulação de pilastras e colunas, como vinha sendo o hábito de da Cortona. Com efeito, as partes resistentes compõem-se de três pilastras sobrepostas sobre as quais e na direcção das quais se desenham os contrafortes, também em três aduelas sobrepostas (figura 32.6). Nos intervalos, abrem-se as janelas do tambor ladeadas por colunas da mesma ordem das pilastras.
Figura 32.6 . Cúpula de San Carlo al Corso . 1668 . Roma . Pietro da Cortona
O entablamento segue o perímetro das sobreposições das pilastras, ainda que seja bastante simplificado nos seus três componentes. O perímetro desenvolve-se em círculo e, imediatamente acima da arquitrave, desenha-se um ático/piso, de janelas ovais sob uma cornija triangular mas que, entre as janelas, acompanha as excrescências e se mantém recta, paralela à cornija. O lanternim é envolto por oito volutas contra-curvadas que sustentam o lanternim.
O interior da cúpula (figura 32.7) também é digno de registo. Os suportes do tambor traduzem a "intranquilidade do exterior, conforme a figura demonstra. Com efeito, o tambor é sustentado por pilastras sobrepostas que alternam com colunas que emolduram as janelas.
Figura 32.7 . Interior da cúpula de San Carlo al Corso . 1668 . Roma . Pietro da Cortona
Coroam este cilindro de penetração de luz uma cornija arquitravada dourada sobre a qual repousa a superfície parabólica com os seus oito raios que, apoiando-se nas pilastras, se juntam num círculo que suporta o lanternim.

A figura 32.8 permite verificar o "caminho" andado por da Cortona, através, também, do desenho de duas cúpulas separadas por cerca de duas décadas. A primeira, já mostrada na figura 31.12, é a da Igreja Santi Martina e Luca, também em RomaA cúpula de San Carlo al Corso parece ter sido a resultante de uma estilização da cúpula de Santi Martina e Luca. O tambor, na primeira, tinha os seus oito tramos separados por pilastras de pouca espessura mas fortemente espessadas no topo, quase parecendo mísulas. As janelas rasgavam-se "naturalmente"  e rematadas por frontões triangulares como numa parede.

Por cima da cornija arquitravada erguem-se os frontões curvos que poderiam sugerir a abertura de óculos, tal a dimensão. As aduelas, marcando a continuação da estruturação vertical do tambor, viriam a ser repercutidas por outros arquitectos.
Figura 32.8 . Cúpulas de Santi Martina e Luca e de San Carlo al Corso . Roma . Pietro da Cortona
Na segunda cúpula, parece que Pietro da Cortona sublimou os diferentes componentes e produziu uma das cúpulas mais requintadas da História do Barroco. Assim, as paredes do tambor reduzem-se quase que somente às molduras das janelas, rectangulares e esguias. Os suportes verticais traduzem-se em pilastras, cada uma apondo-se a duas gémeas. Geminadas também a estas pilastras extremas, dispõem-se colunas. Pilastras e colunas sustentam o entablamento, nas suas três componentes estriadas, como da Cortona costumava usar. Acima da cornija assenta um ático-piso, muito baixo, que se abre em óculos ovais encimados por frontões triangulares que se unem através de uma subtil cornija dupla que se une aos troços rectos correspondentes às pilastras. Resumindo, poderia pensar-se que os frontões curvos reduziram-se em altura e abriram-se. Não deixa de ser também curioso que as volutas verticais do lanternim da cúpula de San Carlo parecem ter-se desenvolvido em altura permitindo maior e melhor iluminação para o interior.

Enquanto pintor teve obra de relevo, entre as quais o famoso quadro "O Rapto das Sabinas", de finais dos anos 20 (figura 32.9). Este tema foi de extrema popularidade desde o Renascimento. E no Barroco também, com a obra de Bernini, como veremos.

Figura 32.9 . "O Rapto das Sabinas . Pietro da Cortona
São também famosos os frescos do Palácio Pitti, de Florença, como, por exemplo, a Sala de Marte (figura 32.10).
Figura 32.10. Sala de Marte - tecto . Palácio Pitti . Florença . Pietro da Cortona
ou a Sala de Apolo (figura 32.11), de 1647, onde além da pintura a fresco, propriamente dita, ainda se podem contemplar os estuques que também emolduram os tectos das outras salas da sua autoria.
Figura 32.11. Sala de Apolo - tecto . 1647 . Palácio Pitti . Florença . Pietro da Cortona
Ainda antes de terminar a obra arquitectónica de da Cortona, pode contemplar-se a sua proposta para o alçado nascente do Palácio do Louvre (figura 32.12), em Paris, obra para a qual concorreu também Gian Lorenzo Bernini. 
Figura 32.12. Fachada Nascente para o Palácio do Louvre (proposta concursante) . Paris . Pietro da Cortona
Este desenho esteve muito tempo nos arquivos do Museu do Louvre, tendo sido descoberto há relativamente pouco tempo, tendo-lhe sido atribuída a sua autoria.
Somente sabendo-se de quem foi o projecto se acreditará. Na verdade, depois dos alçados tão caprichados no manuseamento das ordens tectónicas, na excelência das composições se poderá admitir que Pitero da Cortona tenha desenhado esta proposta que, como é suposto, teria sido um "compromisso" assumido para agradar ao gosto francês.
Mas, tanto quanto a deficiente definição possa revelar (figura 32.13), as pilastras triplas, ou colunas, separando os três vãos centrais e o jogo entre a serliana frontal e das falsas serlianas, que a ladeiam, poderiam ser da autoria de Pietro da Cortona.
Figura 32.13. Fachada Nascente para o Palácio do Louvre (pormenor da proposta concursante)
Paris . Pietro da Cortona
E, para finalizar este olhar sobre a obra de Pietro da Cortona, um dos seus primeiros frescos "Santa Bibiana recusando-se a adorar outros deuses" que ele pintou, numa das paredes do clerestório do lado do Evangelho na Igreja de Santa Bibiana (figura 32.14), em Roma, igreja recuperando uma basílica, e cuja frontaria foi a primeira que Bernini realizou.
Figura 32.14. "Santa Bibiana recusando-se adorar outros deuses"
Igreja de Santa Bibiana . Roma . Pietro da Cortona
a seguir: (2JAN20)
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Gian Lorenzo Bernini: Arquitecto e Escultor magistral

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