20DEZ18
Os Palácios urbanos - I PALAZZI (continuação)

Na senda de outro palácio urbano de Florença, há que referenciar o Palácio Strozzi (figura 6.1) cuja construção se iniciou em 1489, sob projecto do arquitecto Benedetto da Maiano, ou a ele atribuído, segundo o parecer de Vasari, e apenas terminado em 1538, por Baccio d’Agnolo ou por Il Cronaca (Simone de Pollaiolo). Depois de havermos visto os dois palácios urbanos florentinos, este parece não sair de uma aparente sistematização de características sedimentadas das “fortalezas urbanas”, como já haviam sido referenciados.
Figura 6.1 . Alçado principal do Palácio Strozzi . 1489/1538 . Florença . Benedetto da Maiano . Il Cronaca 
Assim, poder-se-á dizer, embora com algum risco, que, de um modo geral, os palacetes (expressão portuguesa que se coaduna com os palácios urbanos) ou os palazzi são passíveis de serem englobados em seis parâmetros:
A. três estratos e três pisos assinalados por frisos, com o perfil de cornija.

B. janelas assentando sobre o friso separador dos pisos.

C. janelas duplas nos segundo e terceiro pisos, com colunelo central e com padieira em arco perfeito.

D. estereotomia acusada expressamente nas paredes. Também nos arcos da porta e janelas, com as aduelas radiantes.

E. aberturas escassas no primeiro piso: porta de entrada e somente postigos rectangulares.

F. subtil marcação do eixo de simetria especular.
Figura 6.2 . Palácio Strozzi . alçado, planta e pormenores
A leitura da planta, no meio da figura de cima (figura 6.2), presumidamente correspondendo ao piano nobile, dá-nos uma visão de compartimentos possivelmente ajustados a cada um dos seus destinos. Os três compartimentos do lado direito, relativos à fachada principal, são autónomos e cada um possui apenas uma entrada a partir do cortile. Também do lado contrário, o compartimento do meio comunica com o cortile através de uma única porta. Todos os outros compartimentos se intercomunicam dois a dois ou três a três. A este tipo de comunicação interna, quer pelo centro quer pelos lados dos compartimentos, se dá o nome de "enfilade", a designação francesa para significar "em enfiada, em fila". O corredor só mais tarde viria a substituir este processo de passagem .
Figura 6.3 . Palácio Strozzi . Pátio interior 
Também pela leitura da figura 6.2 há que referenciar uma particularidade que poderá dizer-se, sem grande erro, ser comum a outros e não só aos palácios que acabámos de ver. E esse espaço, verdadeira obra-prima da arquitetura nascida no aro do Mediterrâneo, é o pátio interior. Vai significar uma vivência bucólica no meio da cidade, à época cidade essa em que a segurança pessoal não seria uma das suas características. Não foi por acaso que os primeiros pisos destas moradias se apresentam “fechados”, como arremedos de fortificações, em contraste absoluto com o pátio que se substitui ao campo. A leveza arquitectónica contrasta com a macicez do exterior. O pátio do palácio Strozzi (figura 6.3) abre-se num rectângulo de cinco tramos por três, portanto na proporção 3/5.
É de se notar a grande abertura e delicadeza desta zona do interior da casa em contraste com a macicez do exterior.
As colunas, de fustes lisos e de capitéis coríntios, embora de folhagem um tanto dispersa e individualizada, parecem rematar em ábacos duplicados e sobrepostos, que recebem o empuxe dos arcos. A essa peça intermédia entre o cimo do ábaco e a descarga do arco ou porventura de um lintel, se chama dosseret
Dosseret - palavra francesa sem tradução aparente. Os ingleses, também sem palavra própria, chamam-lhe super-abacus, seja um super-ábaco, se assim lhe quisermos chamar.
Muito próximo do partido estético do Palácio Stozzi, da autoria de Giuliano da Sangallo (de quem se tornará a falar), em Florença se ergue o Palácio Gondi (figura 6.4), a partir de 1489.
Também de três estratos, com a demarcação feita por frisos, tem sete rasgamentos em cada estrato/piso. 
Figura 6.4 . Palazzo Gondi . 1489 . Florença . Giuliano da Sangallo
O piso térreo tem três portas e quatro postigos. Em relação ao Stozzi, além de ter menos duas janelas por piso, aqui são de volta inteira e já não têm colunelos ao centro sendo, portanto, de lume único. A cornija é mais moderada na sua projecção, ainda que também mutulada.
A figura 6.5 expressa bem as diferenças de tratamento da pedra do estrato/piso térreo do que se lhe sobrepõe.
Figura 6.5 . Palazzo Gondi . Pormenor da estereotomia . 1489 . Florença . Giuliano da Sangallo
Relevante também é o seu pátio interior, na proporção, em planta, de 2/3, a proporção dita sesquiáltera.
Figura 6.6 . Palazzo Gondi . Pátio interior . 1489 . Florença . Giuliano da Sangallo
Também em Florença, e agora devido a desenho de Cronaca ou, segundo outros historiadores, devido possivelmente a Baccio d'Agnolo, se destaca outro palacete, o Palazzo Guadagni (figura 6.7), na mesma linha da "tipologia" adoptada mas com uma grande diferença: a existência do quarto e último piso. Além de acrescentar um aos habituais três pisos, este quarto é quase que uma réplica da ligeireza da arquitectura dos pátios, em contraste com a rudeza dos exteriores. Este piso apresenta-se como um varandim capacitando os seus ocupantes de poderem usufruir, de forma tranquila e resguardada, de uma panorâmica admirável sobre Florença. Um "passo" magnífico ao transpor-se a loggia - piso térreo - para uma loggia aérea. Com algum atrevimento, será o mesmo significante para dois significados distintos: a loja e a varanda/mirante.
Figura 6.7 . Palazzo Guadagni. 1507 . Florença . Il Cronaca ou Baccio d'Agnolo
Para além de um quarto piso, e avarandado, também se distingue o acabamento das suas paredes, rebocadas nos pisos superiores e levemente bujardadas no piso térreo (possível alteração mais tardia?). De notar que os rasgamentos, em arcos únicos e sem septos meeiros são envolvidos por aduelas de pedra com forte expressão e, curiosamente, desenhando arcos apontados apesar dos arcos de volta inteira dos próprios rasgamentos como. aliás, na Palácio Gondi, agora visto. 
O pátio interior oferece uma solução arquitectónica interessante na conjugação de arcos descarregando em colunas, numa parede e, na parede seguinte, perfazendo um ângulo de 90º, meias abóbadas descarregando em mísulas, criando um diálogo extremamente pouco vulgar, conforme a figura 6.8 nos mostra. Talvez que uma escassez de espaço tenha proporcionado uma solução tão "pouco-ortodoxa"!
Figura 6.8 . Palazzo Guadagni . Pátio interior . 1507 . Florença . Il Cronaca . Baccio d'Agnolo 
Em Roma, entre 1485 e 1513, construía-se o Palácio da Chancelaria (figura 6.9), encomendado pelo Cardeal Raffaele Riario. É um palácio imenso que alberga também uma capela palatina, preexistente, cuja entrada se faz pela porta mais pequena, do lado direito da fachada.
Figura 6.9 . Palácio da Chancelaria . 1485/1513 . Roma 
Se bem que tenha já sido atribuído a Alberti, sem dúvida por alguma parecença com o Palácio Rucellai, posteriormente tem-se posto a hipótese de que pudesse ter sido Donato Bramante e Andrea Begno ou, como ainda mais recentemente, algumas opiniões atribuem-no a Francesco di Giorgio Martini e Baccio Pontelli. Os três pisos e três estratos coincidentes estão na linha da tipologia dos palácios florentinos, no que respeita à divisão por andares, ou pisos, coincidentes com estratos.
Figura 6.10 . Palácio da Chancelaria . Pormenor da fachada 
Outra faceta curiosa é o facto de o tratamento da estereotomia ser quase idêntica ao do Rucellai, pela divisão nítida entre cada uma das pedras, e pelo acabamento das pedras mais rugoso para o primeiro piso, outro menos rugoso para o piso do meio e, finalmente, um tratamento mais macio para o piso superior. A fachada principal tem doze tramos com aberturas, alternados com treze tramos cegos, e remata-se com dois pavilhões - assim chamados os avanços dos extremos - que são constituídos por um tramo, com aberturas, ladeado por dois tramos cegos. Trinta e um tramos, no total: fachada marcada por tramos, assim tão extensa, será difícil de se encontrar.

Devido à preexistência de uma capela palatina, com a entrada privativa, e a necessidade de se individualizar a entrada para o palácio, o arquitecto suprimiu a diferenciação dos tramos no piso térreo, dando somente aos segundo e terceiro pisos as referidas diferenciações (figura 6.10) e o número de tramos já apontado. Esta opção de tornar a parede do primeiro piso destituída de quaisquer sinais de estruturas verticais foi uma solução realmente engenhosa, no sentido de fazer passar despercebida a falta de simetria especular. A não ter sido assim, seria deveras quase impossível coordenar o ritmo deste piso cuja entrada principal para o palácio se encontra ladeada por quatro janelas, de cada lado, e a entrada para a capela ser ladeada por quatro janelas no lado esquerdo e somente por duas no lado direito. 

Os tramos cegos são mais estreitos do que os que possuem aberturas. As pilastras são da ordem coríntia (possivelmente as do terceiro piso serão compósitas, não tendo eu indicação mais exacta). As janelas do segundo piso, todas iguais, apresentam padieira em arco de volta perfeita, mas são enquadradas por uma moldura que remata numa cornija recta sobre a qual se desenha uma pequena roseta. As janelas do terceiro piso são de perfil recto, também com uma pequena cornija rematando a padieira. Sobre estas abrem-se pequenos postigos arqueados (exceptuando as janelas dos pavilhões) que parecem anunciar um mezanino, dado que não há qualquer tipo de moldura separando horizontalmente as aberturas aprumadas. 
O andar térreo tem um friso contínuo onde assentam as janelas de recorte simplificado e de padieira em volta perfeita. O friso que separa este piso do segundo revela-se como um estreito entablamento de cornija salientada, anunciando-se quase como que um estilóbata, rematando um crepidoma sofisticado. O friso que separa o segundo do terceiro piso apresenta-se mais empolado do que os outros dois, resolvendo-se num entablamento completo e de cornija ainda mais saliente do que a anteriormente descrita. Finalmente o remate do edifício é feito por um entablamento não muito alto, mas com o friso desenvolvendo fortes mísulas ou modilhões que suportam a cornija projectante. 

A singularidade mais expressiva deste alçado é, contudo, a existência de áticos-dado, de altura bem expressiva, suportando o segundo e o terceiro pisos. Áticos a que nem sequer faltam os empuxes acusando as pilastras que, assim, repousam em pedestais. É, de facto, um alçado notável, tal a lógica de se contornar uma problemática dificílima de ser bem resolvida arquitectural e arquitectonicamente. 
Figura 6.11 . Palácio da Chancelaria . Cortile . Donato Bramante (?) 
O seu cortile (figura 6.11), também de três pisos, contrasta em absoluto com o exterior nos dois primeiros pisos, haja em vista a abertura que as arcadas oferecem. Mais uma vez encontramos colunas sobre as quais pousam arcos de volta perfeita, mas sem o recurso a dosserets. Os capitéis são esbeltos, acusando um pequeno equino, e os ábacos são constituídos por um friso e cornija pronunciada, dentro de um espírito de simplicidade.
É também de notar que as guardas dos pisos avarandados se resolvem em áticos-dado, acusando-se os pedestais das colunas. E, talvez que de extrema singularidade, seja o facto deste terceiro piso interior copiar o terceiro piso exterior, no respeitante às janelas e possíveis mezaninos e, também, na separação dos tramos realizada por pilastras. De referir, ainda que, neste espaço interno, os tramos são iguais e não ritmados em alternância com tramos cegos como no exterior.

O Palazzo Torlonia al Borgo (figura 6.12), em Roma, da autoria de  Andrea Bregno, é, sem dúvida, uma réplica ao palácio da Chancelaria. Construído para o Cardeal Adriano Castellesi da Corneto, de 1496/1506, a fachada principal do palácio tem sete tramos; no entanto, esta divisão  em sete pressupõe que se apelidem as pilastras de gémeas, embora com um afastamento algo significativo para assim serem designadas.
Figura 6.12 . Palazzo Torlonia (Giraud) . 1496/1506 . Roma . Andrea Bregno

Tem um piso térreo bastante hermético, apenas com seis janelas algo pequenas para a grande superfície vertical, onde se sobre-salienta um portal de grande altura e com as ombreiras e padieira duplicadas a 90º. Uma solução estranha, para a época?
Os estratos superiores também assentam sobre áticos-dado que, tal como no Palácio da Chancelaria, reproduzem o desenho dos pedestais das pilastras. Embora com um eixo de simetria a meio e bem respeitado, o piso térreo também não tem marcação de pilastras, parecendo seguir o modelo anterior. Não deixa de ser interessante que tanto num como noutro caso, o piano nobile é subtilmente anunciado.
Figura 6.13 . Palazzo Torlonia (Giraud) . Pátio interior . 1496/1506 . Roma . Andrea Bregno
Contrariamente aos exemplos que vimos, o pátio interior deste Palácio Torlonia (figura 6.13) é bastaste austero, escolhendo pilares de forte expressão e de uma ordem Toscana bem simplificada. 

Na sequência destes palácios alla romana, como começaram a ser designados em Florença, e no início com uma carga depreciativa, o palácio Bartolini Salimbeni (figura 6.14) é digno de registo.
Ainda que seja considerado já de um período maduro do Renascimento e quase na fase maneirista, não deixa de ser curioso que a fachada contenha alguns aspectos que a ligam com o período gótico, como sejam as janelas do segundo e terceiro pisos.
Figura 6.14 . Palácio Bartolini Salimbeni . 1520/23 . Baccio d’Agnolo 
Com efeito, as janelas quadripartidas por finos colunelos e linteis delicados, de pedra, estão ainda muito dentro do espírito gótico. 
No piso térreo, a porta encontra-se flanqueada por uma janela de cada lado. Janelas que têm também o carácter de quase postigos, ainda que a decoração seja já de um primor de eloquência arquitectural. 
A porta guarnece-se de duas colunas embebidas, suportando um entablamento e um frontão triangular. Este conjunto de porta e respectiva moldura não é mais do que a redução e simplificação do entendimento da fachada de um templo clássico. E é este um dos fundamentos para a compreensão da estruturação das fachadas clássicas, quer obedecendo à estrutura porticada verdadeira, quer às estruturas porticadas apenas insinuadas, com relevo ou apenas desenhadas.
As janelas que ladeiam a porta têm frontões curvos que, ainda na lógica de a b a, alternam com o frontão triangular da porta, assim como as janelas rematadas por frontões triangulares do segundo piso alternam com o frontão curvo da janela do meio. O último piso repete a mesma alternância de frontões do piso térreo. Esta alternância entre tímpanos curvos e tímpanos triangulares deve-se, para muitos autores, a Miguel Ângelo como tendo sido a utilizá-la primeiramente.
É ainda de se notar que os três estratos e três pisos, coincidentes, são marcados por cornijas arquitravadas, embora de forma bastante sofisticada, ainda que o remate superior da fachada seja em cornija arquitravada com um denticulado que suporta a cornija bem protuberante. 

a seguir (3JAN19):
7
FRANCESCO DI GIORGIO MARTINI
a VENEZA de MAURO CODUCCI

6DEZ18
SANTA MARIA NOVELLA - uma fachada seminal
I  PALAZZI

Com outra igreja, agora somente da fachada (figura 5.1) se tratando, e datando de 1470 o seu acabamento, Alberti atinge um resultado fascinante, uma mágica que somente os grandes conseguem alcançar: o cruzamento entre a linguagem dos antigos com a linguagem dos modernos. 

Em Florença, Alberti foi chamado a dar uma nova cara à igreja de Santa Maria Novella, gótica de origem. Tinha três naves, sendo de perfil basilical, isto é, sendo a nave central mais alta do que as laterais, acima da altura das quais se abria o clerestório, como era corrente. Neste caso o clerestório era resolvido por meio de pequenas rosáceas, a eixo dos arcos quebrados e encimando as paredes formeiras.
Figura 5.1 . Fachada de Santa Maria Novella . 1470 . Florença . Leon Battista Alberti 
A fachada tinha três portas, sendo as duas laterais ladeadas por dois arcossólios, nos extremos da fachada, e por um arcossólio separando-as da porta principal. Este arcos quebrados, e por isso conotados com o estilo gótico, contém túmulos de figuras ilustres, à maneira etrusca, tal conforme se viu no Templo Malatestiano, de Rimini
Figura 5.2 . Decomposição geométrica da fachada de Santa Maria Novella . Florença
Alberti solucionou a fachada propondo duas diferentes alturas, “inserindo-as” em três quadrados: dois, lado a lado, no piso térreo, e o segundo num andar sobreposto (figura 5.2), a meio do rectângulo composto pelos dois quadrados referidos. Estes dois quadrados, constituindo o primeiro estrato, Alberti rematou-os com um entablamento notável, com uma arquitrave, um friso deveras monumental decorado com quadrados embutidos contendo uma roseta no meio e, finalmente, uma cornija bastante modesta de altura. Este entablamento encontra-se suportado por duas pilastras salientes, nos extremos laterais da fachada, e por quatro colunas isentas, embora encostadas ao plano da fachada. É de notar que estas pilastras extremas se prolongam para cima da arquitrave e rematam-se no topo do friso. O segundo estrato é talvez o achado mais transcendente desta composição: Alberti desenha o frontispício de um pequeno templo tetrastilo, rematado por imponente frontão triangular. As pilastras desenham o intercolúnio com o ritmo a b a, na medida em que o tramo central teria que albergar a rosácea gótica preexistente. Este pequeno “templo” tem, no seu friso bem proporcionado, a data de MCCCCLXX. O frontão desenha-se imponente com as rampantes repercutindo o desenho da cornija. 

Mas, a conquista mais importante no desenho desta transformação antigo-moderno acontece nas partes laterais deste tempietto (figura 5.3) que é o segundo estrato desta fachada: as VOLUTAS. E cada voluta inscreve-se num quadrado.
Figura 5.3 . Voluta da fachada de Santa Maria Novella . Figura 5.4 . Voluta da fachada de Il Gesù . 1580 . Roma
Foi, de facto, Alberti o inventor de um novo significante arquitectónico. Ele inventou a voluta bidimensional para reduzir o impacte que a diferença de cotas das alturas (figura 5.3) das naves da igreja gótica apresentava. Cento e dez anos depois, numa das mais copiadas fachadas barrocas (figura 5.4), de Roma, da autoria de Giacomo della Porta, a voluta ganha novas sintaxes e transforma-se em tridimensional, prescindindo de motivos decorativos como os embrechados que a primitiva voluta de Alberti apresentava.

Se o Medievo elegeu os espaços eclesiásticos como seus símbolos edificatórios, e por maioria de razão, a CATEDRAL, o Renascimento elegeu a CASA como o seu símbolo, numa clara antecipação do que no Barroco haveria de maior ostentação: o PALÁCIO. Não obstante, é no Renascimento que se dá início à maior igreja da Cristandade: a Basílica de São Pedro, de Roma.

Assim, ainda sob o lema da obra de Alberti, o Palácio Rucellai (figura 5.5), de meados do século XV (1446/51), é uma das peças chave da arquitectura civil da Renascença. Nunca foi acabado por razões que se prendiam com a posse do terreno para o completar. Mas, o que remanesce é uma das fachadas mais bem conseguida em termos de composição que somente quem foi extremamente prolífico e conhecedor seria capaz de ter realizado. 
Figura 5.5. Fachada e planta do Palácio Rucellai . Florença
De outro modo não parece fazer sentido dado que, a fazer fé na presunção de ter sido planeado para oito tramos (os sete tramos hoje existentes e o oitavo para que não foi dada a posse do terreno, por razões que ignoro), isto é, com um número par de tramos o centro seria ocupado por estruturas verticais, pilastras neste caso, partido compositivo impensável. 
Assim, contemplemos o alçado principal (figura 5.6) desta moradia que haveria de ser uma fonte de inspiração para outros arquitectos.
Figura 5.6 . Fachada do Palácio Rucellai . 1446/51 . Florença . Leon Battista Alberti
Não deixa de ser bastante curioso o facto das janelas do segundo e terceiro estratos serem de dois lumes, com um colunelo a dividi-los, formalização herdada do período gótico, ainda que os arcos sejam de volta perfeita. Outro facto curioso é a não demarcação especial do piano nobile - o andar nobre, geralmente o primeiro andar - como viria a ser uma norma que perdurou muito para além do Renascimento, a não ser apenas o leve apontamento do brasão de armas (figura 5.7) a encimar o arco da janela central. 
Os estratos do alçado principal são separados por entablamentos, com os seus três elementos, sendo o friso que remata o terceiro piso/estrato resolvido por mísulas que suportam a cornija não muito pronunciada. Acima deste terceiro estrato ainda se implanta um ático-piso, não visível da rua, que se destinava à acomodação dos serventuários.
A parede é ritmada por dois tramos iguais, um outro um pouco mais desenvolvido, contendo a porta, e outros dois iguais aos primeiros, num ritmo a a b a a b a a
Figura 5.7 . Pormenor da fachada do Palácio Rucellai . 1446/51 . Florença . Leon Battista Alberti
A diferença entre os tramos a e b é muito subtil (figura 5.7), apenas anunciada pelas janelas dos tramos b serem ligeiramente mais altas. A separação entre tramos faz-se por intermédio de pilastras, bem desenhadas, toscanas no piso térreo, jónicas no piso intermédio e coríntias no terceiro piso. 
De assinalar, também, ainda que os capitéis da ordem jónica tenham um desenho em que as volutas pareçam pertencentes à ordem coríntia. Para muitos autores, o Rucellai teria sido o primeiro a ter as três ordens, em simultâneo, num alçado de arquitectura doméstica. 
Tanto a demarcação das pilastras como da estereotomia da pedra, que marcam a fachada, são feitas pelo refundamento entre pedras, tridimensionalizando o alçado de uma forma assinalável. É de referir que Alberti, no primeiro piso desta “fortaleza citadina”, um tanto como devem ser entendidas, faz recurso de um pódio, qual crepidoma em opus reticulatum, além de representar uma estereotomia de blocos maiores e mais vincados do que nos outros pisos superiores. 

O palácio Medici Riccardi, de grande presença citadina, é um dos palácios mais deslumbrantes de Florença e de toda a época renascentista. Com efeito, ainda que tenha herdado alguns artefactos do Rucellai, o Medici Ricardi acabou por ser o palácio renascentista mais visado em alguns dos seus atributos. Do Rucellai copia as mesmas janelas, de duplo lume separados por um colunelo, ambos os lumes inseridos numa moldura de volta perfeita. Apresenta três estratos correspondentes aos três pisos. No entanto, a separar os estratos apenas um ligeiro friso, mas com o perfil de uma pequena cornija.
Figura 5.8 . Palácio Medici Riccardi . 1466/50 . Florença . Michelloso Michellosi
Apresenta também uma característica interessantíssima que é o facto de a qualidade do acabamento das paredes ser diferente em cada piso (figura 5.8). No primeiro é alvenaria de pedra rusticada, de aspecto bastante rude; no segundo piso a alvenaria de pedra já é levemente bujardada e, finalmente, no terceiro piso a pedra é alisada. Em todas estas três superfícies a estereotomia está bem presente. E também é de se registar que a parede não apresenta divisões de tramos.  Nem tão pouco os ângulos são reforçados por pilastras. 
O coroamento do edifício faz-se por um pujante entablamento, projectando-se com o perfil de uma cornija, entablamento esse constituído nos seus três elementos e com o friso projectando mútulas que sustentam a cornija. 
Outra característica interessante é o facto da estereotomia dos arcos que encimam as janelas serem radiantes, obedecendo aos conceitos básicos da construção de arcos como se viu já no palácio Rucellai e verá no palácio Strozzi, bem como em outros palazzi

A observação atenta da fachada principal do Palácio Medici-Ricardi (figura 5.9) revela-nos uma certa incongruência: ao estabelecermos o eixo de simetria axial, veremos que, no primeiro piso, ele passa no meio da janela central e para cada lado dispõem-se três postigos, uma porta, dois postigos e uma janela.
Figura 5.9 . Fachada do Palácio Medici Riccardi . 1466/50 . Florença . Michelloso Michellosi
 No entanto, nos dois pisos de cima, o eixo de simetria passa entre duas janelas e não pelo meio de um vão, como seria suposto fazê-lo e como se localizava a então porta de entrada. Acontece que no segundo piso, do lado direito da fachada encontram-se oito janelas e no lado esquerdo encontram-se nove janelas. Depois, no terceiro piso encontram-se oito janelas de cada lado do eixo de simetria. É evidente que esta descoordenação leva a que as janelas do lado esquerdo do edifício não se encontrem aprumadas. Estou em crer que o que provocou esta falha de simetria especular poderá já ter sido ou virá a ser teor de trabalhos de investigação, sem dúvida, fascinantes. 
Figura 5.10 . Finestra inginocchiata na fachada do Palácio Medici Riccardi . 1571 . Miguel Ângelo
Esta fachada é rematada por um entablamento robusto, repetindo um tanto o do Rucellai no sentido em que o friso se desenvolve em possantes mísulas que suportam a cornija muito saliente. Mas esta fachada ainda nos dá a conhecer outra modificação a que esteve sujeita, no piso térreo, e que consta do fechamento de três das cinco portas que primitivamente suportava, portas que eram tão comuns às logge. Em 1517, pelo traço de Miguel Ângelo, estas portas são encerradas e transformadas em ”janelas ajoelhadas" (figura 5.10), ou sejam, as finestre inginocchiate.
Em contraste absoluto com o exterior, fechado qual fortaleza, o interior (figura 5.11) deste palácio, bem como regra geral de todos os outros palácios urbanos, é delicadamente aberto, um jardim-oásis dentro da cidade. É um refúgio seguro relativamente a uma certa intranquilidade algo violenta do exterior.
Figura 5.11 . Palácio Medici Riccardi . Pátio interior
Uma chamada de atenção para, mais uma vez nos alertarmos do modo como os arcos descarregam sobre as colunas, sem qualquer "artifício brunelleschiano", isto é, sem qualquer reminiscente de entablamento.
No Medici Ricardi, ainda que as colunas e a arcada confiram bastante leveza aos alçados do pátio, os aspectos decorativos são bem presentes como as guirlandas e medalhões enfeitando o friso bastante alto que se sobrepõe à arquitrave da colunata, como o paralelismo que existe no desenhar da estereotomia que copia a do exterior. Também as janelas que se abrem no pátio, tal como as do exterior, são de dois lumes geminados com colunelo a separá-los e rematadas em arcos com o desenho das aduelas. Estes pátios, há que lembrar, são herdeiros das domus romanas, com o respectivo peristilo. Uma casa fechada para fora e aberta para dentro.

Ainda no âmbito da arquitectura residencial, o palácio Antinori 1461/1469 (figura 5.12) da autoria de Giuliano da Maiano, parece repetir à exaustão o modelo visto nos três palácios atrás apontados. Curiosamente, em nenhum dos pisos se vê a vontade expressa de se estabelecer o eixo de simetria a não ser os dois estratos superiores se abrirem num número par de janelas (seis, no total), e o brasão de armas da família se posicionar sobre o eixo. O primeiro piso parece de todo não fazer parte desta composição simétrica, com a porta deslocada para um lado e da abertura de um postigo quase no limite parietal e dois outros do outro lado da porta.
Depois de 1506 o palácio passou para a propriedade de Niccolò Antinori, daí o nome do palácio, e teve obras posteriores com desenho de Baccio d’Agnolo.

Figura 5.12. Palácio Antinori . 1461/69 e 1506 . Florença . Giuliano da Maiano . Baccio d’Agnolo
a seguir (20DEZ18):
6
I PALAZZI - continuação

4 22NOV18 LEON BATTISTA ALBERTI

22NOV18
LEON BATTISTA ALBERTI
de Rimini a Mântua


Depois de Filippo Brunelleschi, passemos a ver a obra de Leon Battista Alberti (Génova 1404 / Roma - 1472).
Entre as primeiras obras de arquitectura de Alberti está a alteração que Segismondo Malatesta, Senhor de Rimini, quis fazer de uma igreja existente, a de São Francisco, gótica de seu traçado, transformando-a no mausoléu para si e demais familiares. Desde o início do século XIX, foi elevada à categoria de Catedral, com a devoção a Santa Colomba.

Figura 4.1 . Planta e alçado do lado da epístula do Templo Malatestiano . 1450 ( início) . Rimini
Leon Battista Alberti
Alberti, sem mexer no interior da igreja, resolve “revestir” o edifício existente apondo-lhe novas fachadas laterais (figura 4.1), enquanto que a fachada da frente é substituída por uma nova parede. As laterais "albertianas", resolvidas em arcos iguais espaçados por pilares de iguais dimensões,  não tiveram qualquer espécie de contemplação para com a localização das aberturas medievais existentes, tendo havido a preocupação única com uma nova métrica que Alberti resolveu por bem executar, conforme as figuras 4.1 e 4.2 bem demonstram.

Figura 4.2 . Perspectiva do lado interior do lado da epístola do Templo Malatestiano . Catedral de Santa Colomba Rimini . Leon Battista Alberti
Estas paredes laterais exteriores dão cumprimento ao costume etrusco de tumulação, consistindo em arcadas contínuas, no vão de cujos arcos se depositariam os túmulos.

A igreja, tal como hoje se apresenta, deixa ainda muitas dúvidas quanto ao projecto original de Alberti. 

Com base numa medalha (figura 4.3) imortalizando Malatesta e a fachada do templo, pensa-se que este edifício poderia ter sido projectado com a volumetria da transcrição bastante fidedigna da leitura da referida medalha.

Figura 4.3 . Medalha com efígie de Segismondo Malatesta e alçado principal do Templo Malatesta . Rimini 

Figura 4.4 . Provável solução para o Templo Malatestiano . 1450 (início) . Rimini . Leon Battista Alberti

Porém, tendo sido Alberti um dos mais acérrimos defensores da architettura all’antica, não deixa de causar uma certa estranheza que ele propusesse como remate do estrato superior e central do templo um arco repousando directamente sobre duas pilastras (figura 4.4), solução esta que se repetiria nos topos do transepto. Pilastras não são colunas, obviamente, como as quatro colunas coríntias, no primeiro estrato, e ainda que apenas semi-colunas, suportando um entablamento com os seus três componentes, como a fachada (figura 4.5) ainda revela.
Figura 4.5 . Fachada principal do Templo Malatestiano . 1450 (início) . Rimini . Leon Battista Alberti
 O templo Malatestiano, ou, hoje, a Catedral de Rimini, estará entre as obras primeiras de Alberti, enquanto arquitecto, mas infelizmente não concluída. Além desta incógnita que nos deixou, este edifício ficou deveras bastante danificado aquando da Grande Guerra.
Ainda que não se possa dar por garantida, como absoluta, a fachada principal, tal como ela hoje se mostra, não haverá dúvidas quanto a certa estranheza da composição.

Em 1460 começava a construção da Igreja de São Sebastião, em Mântua, obra encomendada pelo Duque Ludovico Gonzaga. Trata-se de um templo, dos primeiros a obedecerem a uma planta centralizada, em forma de cruz grega (figura 4.6).
Figura 4.6 . Planta de São Sebastião – corte longitudinal, fachada principal, piso térreo e andar . 1460 (in.) Mântua
Leon Battista Alberti 
Esta cruz grega faz uma simbiose com um quadrado, dilatando assim o espaço central e provocando a particularidade de proporcionar braços extremamente curtos e rematados por exedras, exceptuando o braço que contém a entrada, este admitindo um pronao antecedendo o que se poderá tomar como uma galilé.
Da história deste templo são mais as incertezas do que as certezas, como confirma o site oficial dos Bens Culturais da Lombardia - LombardiaBeniCulturali.
Figura 4.7 . Piso térreo de São Sebastião . Mântua . Leon Battista Alberti 
A leitura do edifício como uma simples igreja não parece ser a mais imediata. Já o Cardeal Francesco Gonzaga, filho do Duque Ludovico, interpelava o pai: 
"non intendeva se l'haveva a reussire in chiesa, o moschea o synagoga" 
(Calzona - Volpi Ghirardini, 1994). 
Portanto, esta formulação de planta centralizada levantava as hipóteses de ser igreja, mesquita ou sinagoga…
Todo o templo se encontra elevado do solo formando um primeiro andar, sobre um outro piso, este térreo, embora de pé-direito muito mais baixo. Este piso térreo, que não tem ligação interna com o superior, não pode assim ser considerado como cripta (figura 4.7). Mas, dada a sua relevância no conjunto arquitectónico, pode levar a crer-se que teria sido destinado a mausoléu da Família Gonzaga. Hoje, e tendo-se considerado a hipótese de ter sido destinado a panteão, não andará muito longe essa pretensão pois que é actualmente o panteão mantovano dos Caídos pela Pátria.
Figura 4.8 . Segundo piso da Igreja de São Sebastião . 1460 (início) . Mântua . Leon Battista Alberti
A igreja, de carácter monumental, resolve-se geometricamente de uma maneira extremamente simples e, ao mesmo tempo, com uma tal conjugação de formas que dificilmente se poderá achar paralelo. Com efeito, a exaltação do centro é realizada principalmente (figura 4.8) pela abóbada de cruzaria de aresta, que cobre o espaço central de planta quadrada. Esta abóbada assenta sobre arcos estriados que descarregam nos vértices interiores em mísulas que parecem ser constituídas por um fragmento de entablamento assentando sobre um outro entablamento, este somente com friso e cornija. As paredes que suportam a abóbada abrem-se em arcos paralelos ao da sustentação da abóbada, e que se prolongam brevemente constituindo os braços da igreja que ficam reduzidos quase que a meros apêndices. As paredes limite dos lados do transepto e da capela-mor fecham as abóbadas e nelas se inserem portas falsas rematadas em semicírculo sobre as quais se inserem óculos.
Figura 4.9 . Fachada de São Sebastião . 1460 (início) . Mântua . Leon Battista Alberti 
A fachada de São Sebastião continuará a ser um “quebra-cabeças” no que respeita à verdadeira solução primitiva, nomeadamente na questão do acesso ao templo, a uma cota alta. É do início ou meados dos anos 20, do século passado, que datam as duas escadas laterais de acesso aos dois arcos (figura 4.9) do pronao. Provavelmente Alberti previu a entrada na igreja através do acesso, por escadas, cobertas pela loggia do lado do Evangelho e, provavelmente, as cinco aberturas do pronao seriam meros pórticos com guardas.

Esta fachada, tal como se apresenta no respeitante à sua cimafronte, suscita grandes perplexidades. É certo que, para Alberti, uma parede poderia ser sustentada por colunas “embebidas”.
E, aqui em São Sebastião, Alberti não as utiliza. Utiliza duas pilastras, uma em cada um dos extremos da fachada, e outras duas com metade da altura, enquadrando uma falsa edícula. A fachada é de piso único, embora que, pela leitura da disposição das aberturas, se possa deduzir poder ela corresponder à altura de três pisos.
O mais intrigante, no entanto, é a interrupção do entablamento, de expressão fortíssima, onde o friso quase corresponde ao dobro quer da arquitrave, quer da cornija. Este hiato resulta numa janela, sobre a que se apoia um arco cego de cornija fortemente pronunciada.
O que poderia esta disrupção tectónica querer significar? Alberti, o grande teorizador, um dos arquitectos all’antica, tendo concebido a sua De re aedificatoria, como é possível aventurar-se a um sinónimo de ruptura estruturante de um pórtico? O frontão fica em desequilíbrio de forças, com as rampantes descarregando apenas sobre os dois troços de entablamento separados por um vazio, levando a que o tímpano, de conformação triangular habitual, se desenhe como uma seta ou flecha, dado que irrompe pela imafronte.
Que Giulio Romano se tenha aventurado a insinuar ameaças de ruínas no Palazzo del Té (conforme teremos ocasião de ver), compreende-se vindo de um Maneirista. Mas que Alberti tenha desenhado uma tal fachada será sempre uma interrogação que a simples lógica do meu entendimento sobre o purismo renascentista levantará.
Figura 4.10 . Fachada sudoeste de São Sebastião . 1460 (início) . Mântua
Leon Battista Alberti 
A fachada sudoeste do templo (figura 4.10) revela, sem qualquer espécie de subterfúgios, a interpenetração entre a cruz grega e o quadrado, isto é, as figuras planas que estão na base da espacialidade interior.

Para a mesma cidade de Mântua, em 1470, Alberti projecta a Basílica de Santo André (figura 4.10), encomendada pelo mesmo Duque Ludovico Gonzaga, para nela se venerar o Sangue de Cristo. 
Nunca concluída, iniciada no ano da morte de Alberti, e ainda com edificações justapostas à parede do lado da Epístola (figura 4.12), é um dos espaços mais notáveis, estranhos e não expectáveis pela grande incógnita que levanta na medida em que o espaço centralizado, como uma das normativas renascentistas, não foi o plano escolhido.
Figura 4.11 . Basílica de Santo André . Planta . 1472 (início) . Mântua. Leon Battista Alberti
Com efeito, a igreja, de grandes dimensões, em cruz latina e de nave única e com grandes capelas laterais, ainda que não-comunicantes (figura 4.11), parece ser muito mais conforme com a lógica que a espacialidade das igrejas pós-tridentinas haveriam de apresentar, não fosse a não comunicação das capelas. E não é demais lembrar que a Basílica começou em 1472, setenta e cinco anos antes do início do Concílio de Trento.
Figura 4.12 . Basílica de Santo André . 1472 (início) . Mântua
Leon Battista Alberti
A nave da basílica (figura 4.13) é grandiosa e houve uma quase obsessão de não se deixar qualquer porção de espaço sem decoração, seja em relevo, em baixo-relevo ou em pintura, embora de datação posterior. As capelas laterais são resolvidas com cobertura em abóbada perfeita e cuja flecha dos arcos é sobreposta por um entablamento, nos seus três componentes. Este entablamento acompanha todo o perímetro do templo, sem interrupções, perfazendo inclusivamente a exedra da capela-mor.
Figura 4.13 . Nave da Basílica de Santo André . 1472 (início) . Mântua . Leon Battista Alberti
Os tramos das capelas alternam com tramos rectos que se dividem em três zonas: junto ao chão, abrem-se em pórticos de não grande altura; nas zonas do meio inserem-se imensos quadros a óleo, com criaturas celestes; nas zonas mais altas rasgam-se óculos cujo diâmetro é tangente às pilastras que separam os tramos da nave e também ao entablamento já referido. Os pórticos contidos nos tramos rectos, atrás referidos, dão acesso a pequenas capelas, de cobertura em cúpula, supostamente para capelas funerárias.
Os tectos, abobadados, criando a zona celestial, devidamente separados das paredes, são resolvidos em caixotões quadrados, não se distinguindo os referentes à nave, ao transepto, às capelas laterais e à capela-mor. O intradorso dos arcos que separam as naves dos lados do transepto e o arco triunfal também são resolvidos por caixotões que, embora de molduras quadrangulares, são de desenho mais elaborado do que os anteriormente descritos.
A exedra desta basílica tem uma resolução bastante original. É dividida em três tramos iguais que repetem os tramos das capelas da nave, sem os tramos mais pequenos, de lintel, e rasgam-se em janelas com parapeitos relativamente baixos e padieiras muito altas. Sobre cada janela, abrem-se óculos, tornando esta capela-mor bastante iluminada.
Ainda que nada acrescente em termos de mais conhecimento, a imagem 4.14 dá-nos uma perspectiva, muito pouco usual, rasando o intradorso de uma abóbada de berço, formada por caixotões quadrados, assente sobre um entablamento fortemente decorado, separando a zona celeste da zona terrena.
Figura 4.14 . Tecto da nave da Igreja de Santo André (vista direccionada para a entrada do templo) . Mântua . Leon Battista Alberti 
O alçado principal (figura 4.15), que nunca se acabou, também tem um desenho bastante original. Os arcos de triunfo de Roma terão sido a grande inspiração de Alberti.
Porém, o humanista e arquitecto que tanto se debruçou sobre a coluna e a legitimidade do seu emprego, parece não ter ousado aqui o seu uso. Em vez disso utilizou pilastras quase sem espessura que se orlam de motivos vegetalistas. 
Figura 4.15 . Fachada de Santo André . Mântua . Leon Battista Alberti e Luca Facelli 
Ainda que tenha sido Luca Facelli a executar a fachada, pois Alberti morreria quatro anos depois do início da construção do templo, parto do princípio de que Facelli não teria adulterado o desenho do Mestre, até mesmo pelas particularidades que o desenho apresenta. São dignas de registo as folhagens que compõem os capitéis, adjectivados de itálicos, principalmente os que rematam as pilastras extremas da fachada.
A solução de três tramos - a b a - em que se resolve a fachada, corresponda à proporção de: 1 2 1. É de referir que esta mesma proporção é a que Alberti utilizou no interior do templo, na marcação das capelas de volta perfeita, que têm como largura o dobro das capelas porticadas.
Esta fachada, no entanto, tem sido comparada a arcos triunfais romanos. De todos os que vi nas pesquisas a que procedi, me parece que o que poderá ter estado na origem (se é que Alberti teria necessitado de um arco determinado), como modelo, tenha sido o Arco dei Gavi, em Verona (figura 4.16), datando do século I d.C. e não o arco de Trajano de Ancona, conforme muitas vezes tem sido referido.
Figura 4.16 . Arco dei Gavi . séc. I d.C. Verona 
a seguir (6DEZ18):
5
SANTA MARIA NOVELLA
I PALAZZI

8NOV18
A FLORENÇA de FILIPPO BRUNELLESCHI
architettura alla moderna versus all'antica
A SERLIANA

Em Florença e em 1419 foi encomendado o Hospital dos Inocentes. A fachada principal, que fecha o lado sudeste da Praça da Santíssima Anunciada (figura 3.1), é resolvida em nove arcos de volta inteira (tendo posteriormente sido acrescentados mais dois arcos, um de cada lado), suportados por colunas coríntias, de capitéis finamente elaborados (figura 3.2) bem assim como os ábacos quadrilobados com rosetas.

Figura 3.1 . Hospital dos Inocentes . 1419 . Florença . Filippo Brunelleschi
Sobre os extradorsos dos arcos assenta um lintel que se divide em três partes, lembrando um entablamento em que a arquitrave se constitui em duas molduras sobrepostas de superfícies distintas. O friso é uma mera faixa rebocada, a cornija é muito reduzida em altura e sobre ela assentam as janelas, constituindo-se, assim, como que um parapeito corrido. A cada um dos arcos, e a eixo, sobrepõe-se uma janela rematada por frontão triangular. 
Figura 3.2 . Capitel da colunata frontal do Hospital dos Inocentes . Florença
Nos esquadros, entre cada um dos arcos, aloja-se um medalhão circular, de contorno salientando-se em três níveis, emoldurando a figura de uma criança, enfeixada (figura 3.3) como costumava o uso de então, fazendo jus ao fim a que era devotada a instituição.
Figura 3.3 . Medalhão de menino enfaixado .Hospital dos Inocentes . Florença . Irmãos Della Robia
Falando-se de arcos descarregando directamente sobre colunas entra-se na diatribe entre os seguidores da arquitectura ANTIGA e os da arquitectura MODERNA.
Leia-se que por arquitectura antiga se entendia o espólio da arquitectura que a civilização romana tinha deixado pela Península Itálica e seus domínios, enquanto que por arquitectura moderna se entendia a arte dos godos - os bárbaros - a arquitectura a que se chama gótica.
Esta arquitectura difundiu-se mais no centro europeu, com principal destaque para França e, mais concretamente, para os arredores de Paris, quando o Abade Suger resolveu reconstruir a Abadia de Saint-Denis, em 1137, assim nascendo o novo estilo – o GÓTICO.

A questão de se pretender um reflexo límpido de sintonia construtiva, isto é, de se pretender “escutar a voz” dos materiais e transcrever essa consonância, que os antigos nos legaram, prende-se com o facto das fachadas porticadas, de herança grega, serem constituídas por colunas suportando um entablamento ou um simples lintel ou verga ou padieira, sempre com um perfil recto. Por este motivo, a pedra constitutiva do lintel não poderia exceder um vão grande e daí a proximidade das colunas, variando os espaços entre estas, ou sejam os intercolúnios, apenas entre 1 1/2 de diâmetro (PICNOSTILO) a 4 diâmetros (AREÓSTILO). 
NOTA:
SISTILO – 2 diâmetros, EUSTILO – 2 ¼ diâmetros e DIASTILO – 3 diâmetros
.
Este elemento recto estabelecia a divisão entre a parte habitada e a cobertura, normalmente a duas águas, em que a empena daí resultante se formalizava em triângulo. E é esta figura geométrica, que tapa o vão desaproveitado do telhado, que se vai transformar numa das peças mais requintadas da composição arquitectónica nobilitando a fachada principal dos templos- o FRONTÃO.
E dificilmente se encontrará uma forma mais prodigiosa de se "invocar" um triângulo do que estas imagens (figura 3.4) que um dia realçaram metade do frontão do Partenon.
Figura 3.4 . Fragmento do Partenon
Ao invés da extensão algo limitada  do lintel, o arco, seja ele de volta perfeita, seja ele apontado, ou seja abatido foi a invenção que permitiu grandes espaçamentos entre os pontos de apoio verticais, quer de colunas, quer de pilares ou quer ainda de paredes. 
E sendo o Renascimento o renascer da arquitectura clássica, onde não havia qualquer arco interveniente neste processo construtivo, não deveriam as colunas constituírem-se  como apoios dos arcos. 
Na figura 3.5 justapôs-se a fachada do pórtico da Villa Rotonda, de Palladio, com a fachada de arcaria do Hospital dos Inocentes, demonstrando-se as duas concepções: dos antigos e dos modernos, se forem lidas as fachadas da esquerda para a direita, correspondendo, no entanto, a cronologia na direcção oposta.
Figura 3.5 . Villa Rotonda vs. Hospital dos Inocentes
Prosseguindo na observação da obra arquitectónica de Brunelleschi, olhemos para a planta da igreja de São Lourenço (figura 3.6), em Florença, supostamente, a de fundação mais antiga da cidade. Depois de no capítulo anterior termos visto a Sacristia Velha, do lado do Evangelho (a laranja na figura), olhemos agora para o corpo da igreja.
Figura 3.6 . Igreja de São Lourenço com a Sacristia Velha (lado Evangelho), Sacristia Nova (lado da Epístola) e a Capela dos Príncipes (cabeceira). Planta . Florença
Vejamos como Brunelleschi  interpreta o problema entre antigos e modernos, como oferece um dos espaços mais bem conseguidos de arquitectura.
Pelas premissas arrojadas patentes nesse espaço, pela modularidade, pelo emprego das matérias fundamentais para a leitura contrastante dos interiores – a pietra serena contrapondo-se ao reboco pintado de branco -  num jogo de rigor geométrico pouco habitual, parece que este espaço religioso foi uma espécie de “ensaio” do espaço fabuloso que Bruneleschi haveria de construir uns anos depois: a igreja de Santo Spirito, também em Florença e já referida no capítulo 2 (25OUT18)
Mas, entretanto, depois de 1441, os trabalhos foram entregues a Michelozzo, arquitecto que se encarregaria do seu prosseguimento, dado que Brunelleschi, então já ancião, se dedicava a outras obras. 
Eis o interior de São Lourenço (figura 3.7), astuciosamente ligando as duas concepções. Penso que nunca será demais enaltecer a capacidade de Brunelleschi ter lidado de forma tão exemplar com a questão das duas opções: alla moderna, na colunata da nave central; all'antica, no porticado impresso nas paredes das naves laterais. É também de salientar que as pilastras, que visualmente simulam ou estruturam as paredes laterais exteriores, são sobrepostas e encimadas por um entablamento em tudo semelhante ao que Brunelleschi usa na fachada do Hospital dos Inocentes.
Figura 3.7. Igreja de São Lourenço . Interior - nave central e naves laterais 
Também nesta mesma matriz se desenvolve o entablamento que se sobrepõe à arcada da colunata na nave central. 
Mas, como facto deveras extraordinário e digno de registo, Brunelleschi parece determinado a aceitar os antigos. Somente por distracção se pode deixar de reparar bem na entrega dos arcos sobre as colunas. De facto, acima dos ábacos repousam peças que, na sua composição, não são mais do que fragmentos de um pretenso entablamento (emoldurado a amarelo na figura 3.7), correndo ao longo da nave central, e bem constituído nos seus três clássicos componentes: arquitrave, friso e cornija. É como se de um imaginado entablamento corrido restassem apenas fragmentos iguais, sobrepondo-se cada um deles a cada um dos ábacos das colunas. De notar, ainda, que tanto as colunas como as pilastras são da mesma ordem, a coríntia (ainda que divergindo em pormenores), contribuindo-se ainda mais para uma homogeneidade visual. É também digno de registo o facto de a cobertura das naves laterais ser resolvido em cúpulas integrando as próprias perxinas, sem solução de continuidade, e a cobertura da nave central ser plana, correspondendo a uma cobertura de madeira como também soía ser a cobertura tradicional das basílicas. 
Curiosamente, a sua fachada (figura 3.8), apesar de concursos em épocas diversas para a sua conclusão, com concorrentes que incluíram Miguel Ângelo, Rafael e Giuliano da Sangallo, entre outros, nunca se chegou a realizar por problemas técnicos e por falta de verbas. 

Figura 3.8 . Igreja de São Lourenço . Fachada poente

Finalmente, chega-se àquela que se considera ser uma obra-prima do espaço arquitectural: a igreja de Santo Spirito, mais tarde elevada a Basílica Menor, que se iniciou em 1444 e veio a ser consagrada em 1487, quarenta e três anos depois, sem, no entanto, lhe ter sido dada a fachada correspondente à época quinhentista, vindo a ser fechada já na época barroca (figura 3.9) com uma frente modesta onde somente o recorte da cimafronte em empena lhe confere o setecentismo.


Antonio Manetti, Giovanni da Gaiole e Salvi d'Andrea foram os arquitectos que se seguiram na conclusão da obra. 
Figura 3.9 . Basílica Menor de Santo Spirito . Fachada do séc. XVII . 1444/87 . Florença 
A imagem do exterior da igreja, tal como se encontra, com o perímetro feito de planos absolutamente lisos, incluindo a fachada principal, difere substancialmente da proposta inicial. 
Figura 3.10. Planta da Basílica Menor de Santo Spirito . 1444/87 . Florença . Filippo Brunellschi 
A planta original da igreja (figura 3.10) tem várias leituras possíveis. Primeira, e que acabou por não corresponder à realização material, é o seu contorno ser proposto em semicilindros, cada um correspondendo à unidade geradora de toda a planta da igreja. Segunda, é a célula espacial que compõe todo o interior, marcando cada tramo em que se dividem as naves laterais que, além de acompanharem a nave central, acompanham todo o desenho da cruz latina que compõe a nave central, o transepto e a capela-mor, como se fosse oferecido um deambulatório contínuo em torno do corpo interior da igreja. Cada célula é composta por quatro apoios verticais  sobre os quais se apoia uma cúpula esférica com as perxinas incorporadas. 
Figura 3.11 . Basílica Menor de Santo Spirito . planta . 1444/87 . Florença . Filippo Brunelleschi
Os espaços correspondentes à capela-mor, ao cruzeiro e a cada um dos braços do transepto, além de iguais, correspondem a quatro das unidades espaciais, dispostas em quadrado. O corpo da nave central corresponde a quatro vezes cada um dos espaços agora referidos, ms dispostos em linha recta. 
No cruzeiro implanta-se um baldaquino (figura 3.11) que contribui para que a percepção espacial seja a de uma igreja de cruz grega, ou de planta centralizada, como tentarei explicar. 
Com efeito, através da planta da igreja (figura 3.10), podemos, mais uma vez, verificar que a capela-mor bem como cada um dos braços do transepto são iguais. Nos topos destas unidades espaciais, de planta quadrada, insere-se uma coluna sobre a qual descarregam dois arcos. Essa coluna fica "estranhamente" no centro do campo de visão. Ora este “entrave” de um elemento sólido em vez de um vão, como seria norma, faz com que na cadência a que o percurso de entrada nos impõe, não nos demos conta de que houve qualquer interrupção e, assim, parecer estarmos numa planta centralizada, tal como na Sacristia Velha, em que não se pode alcançar fisicamente o centro. Na Sacristia Velha pela localização do túmulo, aqui pela existência do baldaquino. 
Figura 3.12 . Igreja de Santo Spirito . Nave lateral . 1444/87 . Florença . Filippo Brunelleschi
Ainda que o sistema estrutural siga a mesma lógica da Igreja de São Lourenço, com os “fragmentos” de um entablamento sobrepostos às colunas coríntias, nas paredes onde se abrem os nichos laterais, em vez de pilastras, como em São Lourenço, Santo Spirito apresenta meias colunas adossadas às paredes divisórias dos nichos (figura 3.12). Estes arcos, que são formeiros dos nichos laterais, conjuntamente com os dois torais das naves laterais e o formeiro da nave principal perfazem o módulo espacial que corre todo o perímetro do espaço da igreja. Contrariamente ao tecto da nave da igreja, que é plano, os módulos referidos, que também constituem as naves laterais, são cobertos por cúpulas, de planta quadrada, e as capelas são coroadas por semicúpulas. 

Ainda que hoje se saiba que durante muitos anos a autoria da Capela dei Pazzi (figura 3.13) estivesse atribuída a Brunelleschi, supondo-se, afinal, não ser, não quero deixar aqui de referir um dos alçados mais inusitados de toda a História da Arquitectura Moderna. E é precisamente a fachada principal do templo, fachada essa que é resolvida através de uma galilé ou pórtico, se assim se lhe quisermos chamar. Mas prefiro usar o termo serliana, ainda que apresente uma duplicação dos lumes porticados, dos lumes a, algo insólito como também insólito é o ático, de forte expressão, ser invadido pelo arco - o lume b - e o remate superior ser ser um "entablamento-guarda" da varanda aberta. 
Figura 3.13. Capela dei Pazzi . Florença
Como se define e porquê o nome de SERLIANA, se também a referência a esta abertura seja denominada JANELA de PALLADIO ou simplesmente MOTIVO PALLADIANO? 

Com efeito, é uma das invenções mais espantosas e grandiosas da Arte de Arquitectar. 
Ao pretender-se um rasgamento de grande largura em construção parietal de pedra, é consabido que a pedra é um material resistente à compressão, não admitindo vãos de grandes dimensões, para o que é necessário um material que trabalhe à tracção. Portanto, o arquitecto que inventou a possibilidade de vencer um vão grande de construção pétrea, sem o tornar "contra-natura", dividiu-o em três tramos. Mas, ao fazer esta divisão, inculcou-lhe um ritmo de espaços, ou lumes, a b a, sendo a mais estreito que b e, além disso, teve a genialidade de distinguir o processo de limitação superior ou, mais explicitamente, o processo de fecho das padieiras. Assim, os vãos mais estreitos são fechados por verga recta, formando um pórtico, e o vão central e mais largo, é colmatado por arco. Deste modo, o vão é composto por três lumes separados por dois elementos verticais, pilares ou colunas. É curioso verificar-se que a serliana se torna mais elegante se os tramos a forem substancialmente menores que o tramo central b. Pelo menos é o que, depois de observados inúmeros casos, me parece como mais consubstanciada esta descoberta arquitectónica. 
Figura 3.14 . Serliana da Villa Adriana . sec. II . Tivoli Figura 38 . Serliana do portal do Tribunal Constitucional séc. XVIII . Lisboa

Talvez que consiga consensos ao mostrar duas serlianas (figura 3.14), distanciadas no tempo, por séculos, a romana (da esquerda)  que, pelo meu parecer, estará nos limites do razoável com os tramos a quase igualando-se ao tramo b, e a de Lisboa (da direita), no extremo oposto de dimensão dos tramos a reduzidos quase ao ilógico, isto é, ao inexistente, somente aludidos pelo espaçamento que os capitéis, mais largos que os fustes, provocam no encontro com as paredes laterais. 
Figura 3.15 . Villa Medici . 1630 ca. Diego Velasquez
Mesmo que a diferença entre os vãos porticados e o vão arqueado seja mais próxima, penso que o limite poderá estar no “Jardim da Villa Medici”, em Roma, pintado por Diego Velasquez, que a figura 3.15 ilustra. 

Ainda que tenha sido Sebastiano Serlio o grande teórico e arquitecto renascentista a consagrar, no seu tratado, este tipo de abertura, e daí a designação de SERLIANA, foi através da obra de Palladio, concretamente da Basílica de Vicenza, que se divulgou a serliana como MOTIVO DE PALLADIO. Uma das características mais esmeradas das serlianas é o facto de os entablamentos sobre os vãos porticados geralmente constarem unicamente de arquitrave e cornija, prescindindo-se do friso, assim adelgaçando todo o perfil da moldura do vão tripartido. Também algo de semelhante oferece o arco, conforme a própria Basílica de Vicenza (figura 3.16) nos evidencia. 
Figura 3.16 . Serliana da Basílica de Vicenza . séc. XVI . Andrea Palladio (representado em estátua)
Ainda uma última nota sobre a serliana e não menos importante: 
SERLIANA agrega, num mesmo vão, a consagração de uma espécie de simbiose entre a arquitettura alla moderna versus arquitectura all'antica.
a seguir (22NOV18):
4
LEON BATTISTA ALBERTI
de Rimini a Mântua